Castelo de Lanhoso
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Ouvi dizer por lanhosenses que quem decide ir conhecer o Castelo de Lanhoso não visita um monumento mas sim quatro: a fortificação, o Núcleo Museológico, o Santuário da Senhora do Pilar, e o Castro de Lanhoso. O que é mentira. Na realidade, são cinco, porque a suportar tudo isto está um único bloco rochoso – uma bomba de granito conhecida por Monte do Pilar ou Laje Grande que é, também ela, um monumento, embora natural.
O complexo de defesa povoense fica a norte da vila e funciona como a sua versão do passado, vista de quase todo o centímetro da urbe. Uma cidadela que, se bem que desabitada, continua a exercer o papel de agregador da comunidade.
Os vários baluartes do Monte do Pilar
O caso repete-se um pouco por todo o país: o castelo que agora se vê é uma construção feita em cima de um outro mais antigo, e este já fora construído em cima de outro ainda mais antigo, e por aí fora… Quando começamos a escavar e escavar no assunto, chegaremos, talvez, à fortificação original, aquela que deu um esboço para tudo o que aí vinha.
O castro de Lanhoso
Ao que parece, já existia um forte por aqui na fase inicial do Calcolítico, ou seja, há cerca de cinco mil anos. Serviu de reduto às tribos que aqui viveram, provavelmente de forma contínua, até à Idade do Ferro, sendo assimilado pela Cultura Castreja que nasceu no noroeste Ibérico. E com a chegada das legiões do Lácio, viu-se readaptado a posto de vigia, provavelmente com o levantamento de uma torre que controlasse a via que ligava Bracara Augusta (actual cidade de Braga) a Asturica Augusta (actual Astorga), passando por Aquae Flaviae (actual cidade de Chaves).
Um longo hiato deve ter existido ainda durante a influência romana e perdurou com a vigência Sueva e Visigótica. Foi necessária a invasão sarracena até ao norte peninsular para que se voltasse a olhar para aquela colina com olhos de militar. Consumada a Reconquista neste cantão nortenho, os cristãos reaproveitaram várias fortalezas para se protegerem de eventuais contra-ataques islâmicos. Mas nem sempre o infiel era o inimigo – por vezes o perigo camuflava-se entre correligionários. Foi neste contexto que o bispado de Braga decidiu recorrer aos velhos baluartes que se encontravam em seu torno para proteger a cidade – um deles era o do Lanhoso, que viria a ser recuperado para servir esse propósito.
A versão medieval do Castelo de Lanhoso foi, portanto, fundada ainda antes da nacionalidade (século XI, muito possivelmente). Serviu ulteriormente de palco a pelo menos dois episódios caricatos da história portuguesa – já lá iremos -, até ser novamente requalificado por iniciativa do saudoso rei D. Dinis.
O castelo de D. Teresa
Teresa de Leão, ou D. Teresa, conforme é conhecida nos livros de história de Portugal, mãe de D. Afonso Henriques e mulher de Henrique de Borgonha, é vista por alguns como a primeira monarca de Portugal – anterior a D. Afonso Henriques, seu filho. Ela própria assim se intitulava, depois de enviuvar. Depois de algumas vitórias contra o inimigo islâmico, o título de regina (isto é, de rainha) contava até com a benção do Papa, que por essa altura era quem mais pesava em matéria de reconhecimento de soberania.
Teresa e Urraca, uma briga de manas
É bom lembrar que esta mulher, tantas vezes maltratada pela pedagogia nacional, foi uma das primeiras vozes a clamar por um Portucal independente do reino de Leão e Castela. Ao ponto enfurecer a sua meia-irmã, D. Urraca, rainha de Leão e Castela e casada com o rei de Aragão. Urraca tornara-se, talvez involuntariamente, uma figura que simbolizava a potencial unificação de todos os reinos hispânicos cristãos: era filha legítima do rei de Leão e Castela, no seu primeiro casamento com Raimundo da Borgonha foi-lhe atribuída a Galiza (que na altura incluía o Condado Portucalense), no seu segundo casamento aliou-se ao reino de Aragão de Afonso I.
A ira de D. Urraca, que tinha pouca tolerância aos tiques autonomistas da meia-irmã Teresa, levou-a ao terreno, entregando-se a uma ofensiva sobre o Condado Portucalense. E dessa peleja resultou um cerco ao Castelo de Lanhoso – a fortificação foi sitiada durante meses, e só uma intervenção diplomática que envolveu várias partes, incluindo o arcebispo de Compostela, pôs termo ao conflito. Em consequência disso, assinou-se o suposto Tratado de Lanhoso, documento que ainda suscita algumas dúvidas quanto à sua veracidade, mas que, a confirmar-se autêntico, obrigava D. Teresa a prestar vassalagem ao reino de Leão e Castela, ainda que, ao mesmo tempo, alargava a esfera administrativa do então Condado por ela regido.
Resta dizer que deste confronto lanhosense resultou uma lenda que, segundo a tradição popular, originou o topónimo da povoação de Valdemil – diz o povo que, numa incursão surpresa, escondido com o manto da noite, um batalhão apoiante de D. Teresa saiu do castelo para infligir duro golpe nos soldados que montavam o cerco ao fortificado, e que tal ousadia tinha custado mil vidas aos adeptos de Urraca, daí o nome Val de Mil.
Passado o contratempo, Teresa, Condessa de Portugal, voltou ao trabalho de regente do condado que herdara. O seu filho Afonso, entretanto, já deixara de ser um bebé. À medida que ele crescia, uma certa ambição independentista, que ele tanto devia ao pai como à mãe, emergia.
Teresa e Afonso, o filho que vence a mãe
D. Teresa, apesar de defensora da independência daquelas que viriam a ser as futuras terras portuguesas, quis que o confronto com Castela acontecesse de braço dado com a Galiza. A ideia era unir ou, no mínimo, aliar estes dois territórios do ocidente Ibérico para, mais fortes, enfrentarem a hegemonia castelhana. Para isso juntou-se a Fernão Peres de Trava, um fidalgo galego. Mas havia no Condado Portucalense quem torcesse o nariz à ideia: certos barões e mesmo clérigos viam na mudança uma possível perda de poder. Concordavam na luta pela autonomia face a Castela, desde que isso não implicasse perder soberania para a vizinhança galega.
Soube-se então que o acordo entre Teresa e Peres de Trava, entretanto, tinha ultrapassado a política. Tornaram-se amantes. A preocupação relativa ao surgimento de um novo reino da Galiza que incorporasse o território Portucalense – como aliás já tinha acontecido antes do Condado ser entregue a D. Henrique -, crescia. D. Paio Mendes da Maia, arcebispo de Braga, liderava o descontentamento. E deu à contestação um novo rosto que agregasse todos os nobres que defendiam a independência do Condado face à sua vizinha a norte: D. Afonso Henriques, filho de D. Teresa.
As duas forças chegaram mesmo a vias de facto, em 1128, na hoje conhecida como Batalha de São Mamede, que opôs os partidários de Afonso Henriques aos de Teresa. Afonso Henriques saiu vencedor, passando a ser ele mesmo o líder incontestado do território Portucalense, agora definitivamente destacado da Galiza. Portugal aprendeu a andar nesse dia.
Quanto a Dona Teresa, há quem diga que se refugiou no Castelo de Lanhoso novamente, embora seja mais fiável acreditar que fugiu de imediato para a Galiza.
O amor e o desamor no Castelo de Lanhoso
Talvez o episódio que hoje se relata seja exagerado. Ou, às tantas, aconteceu tal e qual se conta. Seja lá qual for o caso, o Castelo de Lanhoso não se livra de ser o palco de uma novela medieval que, no fim, lhe prejudicou a saúde.
Era D. Rodrigo Gonçalves Pereira alcaide do castelo – homem que, cinco gerações depois, teria na sua descendência um rapaz que viria a mudar os destinos da nação, Nun’Álvares Pereira.
D. Rodrigo casou com D. Inês Sanches, mulher abençoada pela beleza mas não tanto pela esperteza, e esta aproveitava as ausências do seu marido para consumar um caso com o seu amante, um frade de terras de Bouro. Num desses encontros, por ocasião de uma saída de D. Rodrigo para correr caça grossa, o alcaide foi avisado acerca do comportamento adúltero da sua mulher. Dominado pela raiva, ordenou que se pusesse fogo ao castelo.
Do incêndio, conta-se, nem uma alma se salvou. Finou-se D. Inês Sanches e o amante e, de caminho, todos os criados, considerados cúmplices por não alertarem o seu Senhor da situação. Foi o primeiro grande abanão sofrido pelo Castelo de Lanhoso. Mas não o último.
Muralha e torre de menagem
Os forais e o esquecimento
No decorrer do século XIII, o Castelo de Lanhoso beneficia de novas obras de requalificação. Corria o reinado dionisíaco. D. Dinis foi auspicioso para a fortaleza minhota. Numa altura em que as fronteiras se estabeleciam de forma perene a norte e a sul, qualquer empreitada militar ia perdendo a sua razão de ser. Não obstante, o Lavrador concedeu à vila de Lanhoso o seu primeiro foral, em 1292, num claro sinal de que a sua manutenção era uma prioridade da coroa. Foi por esta altura que se decidiu guarnecer o forte de uma torre de menagem, construída sobre uma outra que ali tinha deixado alicerces.
Mais de duzentos anos depois, aquando da avalanche de forais cedidos por D. Manuel I, o Castelo de Lanhoso também não foi esquecido, renovando-se o foral.
Contudo, depois disso, o histórico reduto de Lanhoso, um dos baluartes que mais interveio no início da história de Portugal, teve o destino de todos os outros: o contexto de guerra tinha mudado. Em Portugal, havia um Império a proteger. Os castelos da casa foram esquecidos, deixados à força dos elementos. Nem os quase trinta anos da Guerra da Restauração foram suficientes para lhe devolver o ânimo.
E pior: na segunda metade do século XVII, um burguês afortunado resolve montar um santuário com igreja e capelas intramuros. Isto não teria qualquer mal não fosse o homem ter-se lembrado de pegar nas pedras da muralha parcialmente arruinada para o fazer. Perdeu-se o que restava de um castelo, ganhou-se uma igreja novinha em folha, actualmente conhecida por Santuário da Senhora do Pilar.
Só já no Portugal republicano, bem dentro do século XX, e já beneficiando da condição de Monumento Nacional, voltaram a olhar para ele. O que agora se vê é produto das reconstruções efectuadas em 1938, 1958, 1973 e 1975.
Dono do Minho
Só cá vindo se percebe o quão invencível é o Castelo de Lanhoso. Assente num gigante afloramento de granito de acessibilidade difícil, a pouco menos de quatrocentos metros de altitude, dominante sobre os vales da Póvoa de Lanhoso, com o Cávado a norte e o Ave a sul, e as alturas do Gerês e da Cabreira ao longe, estamos num colosso onde todo o Minho fica à curta distância do olhar.
O que presentemente se vê, ainda assim, é incompleto face à sua cara medieval. Despareceu a alcáçova, por exemplo. Mas continuamos com uma bela prova do passado, passada a ferro pelas requalificações feitas no último século.
A muralha conta com adarve do lado interior e falsa-braga elíptica do lado exterior – um duplo muro defensivo, portanto, a acentuar a inexpugnabilidade do conjunto.
Dentro da cerca exterior, fica também o Santuário da Senhora do Pilar. No ponto mais alto da fortaleza temos a muralha castelã e a pequena mas robusta torre de menagem, com aproximadamente dez metros de altura, agora convertida em espaço museológico – foi construída, como já se disse, por cima de uma outra torre, possivelmente a de origem romana, entretanto reaproveitada noutras épocas.
A planta do castelo, meio estrambólica, custosa de classificar (há quem a tenha como hexagonal, mas só com esforço vemos ali um hexágono, mesmo que irregular), é bom atestado à imprevisibilidade do terreno. Num misto de românico com gótico, esconso e espremido, montou-se ali o castelo possível, mas não foi o seu perfil diminuto em tamanho que lhe retirou protagonismo. Como se viu, uma boa parte das história deste país é contada daqui.
Póvoa de Lanhoso – o que fazer, onde comer, onde dormir
Portugal nasceu aqui, num baluarte anterior à própria pátria, hoje conhecido como Castelo de Lanhoso - foi especialmente querido à história de D. Teresa, mãe de Afonso Henriques, que alguns consideram a verdadeira primeira monarca portuguesa. Além da renovada fortificação, há, logo ao lado, duas outras construções obrigatórias - o Castro de Lanhoso, que esteve na origem de tudo isto, e o Santuário de Nossa Senhora do Pilar, que começa no sopé do Monte do Pilar e chega até ao seu topo.
E no entanto, apesar dos três exemplos de património histórico descritos acima já serem suficientes para justificar uma visita, Póvoa de Lanhoso tem muito, mas mesmo muito, para ver. A destacar, temos a Filigrana que é trabalhada em Travassos e em Sobradelo da Goma, em primeiro lugar. Em segundo, o Centro Interpretativo Maria da Fonte, um espaço de pesquisa e divulgação de uma das mais célebres figuras da cultura popular, cantada e pintada e esculpida de norte e sul do país enquanto protótipo da mulher nortenha, e que de uma pequena revolta junto à Igreja de Fonte Arcada fez contagem decrescente para uma nova guerra civil. E em terceiro, caso haja possibilidade de ir a meio de Março, as Festas de São José, que se prolongam por uma semana mas que têm no dia 19 de Março o momento da sua majestosa procissão.
Quanto a lugares estivais, o pontão da Barragem de Andorinhas - num trecho predestinado do rio Ave, logo a jusante da lendária Ponte de Mem Gutierres -, e a Praia Fluvial de Verim, no extremo norte do município, são escolhas evidentes. Não muito longe desta última, o Pelourinho de Moure é uma curiosa obra que contraria o manuelino de onde brotou. E numa outra apertada praia, a Praia Fluvial da Rola, há o Santuário da Senhora de Porto d'Ave, responsável pela concorrida Romaria dos Bifes e dos Melões. De referência internacional é o DiverLanhoso, um dos maiores parques de aventura no continente europeu, com diversificada oferta de actividades, mormente para a criançada.
Nas comidas, os dois andares do Velho Minho guardam boa garrafeira e cozinha regional bem preparada - é bom o cabrito, finalizado com um pudim Abade de Priscos. Para dormir, o resguardo da Casa do Monte da Veiga, junto a Calvos (onde respira um dos mais belos carvalhos nacionais), dá noites sossegadas a quem as quiser, mas também a Villa Moura, em Fonte Arcada, entrega boa qualidade de serviço, piscina, e vista desimpedida sobre a serrania que cerca a sede de concelho.
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Mapa
Coordenadas de GPS: lat=41.58682 ; lon=-8.28117