Lenda das Cobras do Alívio

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Um dia que vão ao Santuário do Alívio, em Soutelo, concelho de Vila Verde, procurem alguém que vos abra a porta para a Casa das Promessas, situada na lateral nascente do templo, e armazém de várias ofertas dos peregrinos à sua Senhora do Alívio, como forma de pedido ou agradecimento para a cura de certos males e dores do corpo.
Um milagre vira lenda
Já aqui o dissemos, a propósito da história do Santuário do Alívio, que a sua origem enquanto capela remonta a um suposto milagre de um pároco de Soutelo, que presenciou o aparecimento da Virgem, ficando curado de graves doenças irreversíveis que lhe tinham sido diagnosticadas. Estaríamos no final do século XVIII.
No entanto, depois disso, uma lenda vem à baila que, de acordo com a tradição oral, menciona o ano de 1818, isto é, entre vinte a vinte e cinco anos depois do milagre.
A Lenda das Cobras
Conta-se então que, no Brasil, um português lá emigrado quis descansar e arranjou poiso num comprido tronco de árvore. Reparou que o tronco não era sólido. E não só. O tronco parecia ter vida, até se movimentava ligeiramente. Quando se levantou para olhar melhor o que se passava, percebeu que o seu banco não era um tronco mas sim uma gigante jibóia que se preparava para o atacar.
Invocando a Senhora do Alívio, pediu forças que lhe bastassem para vencer a desproporcional luta. Com a ajuda da Senhora, que veio em seu socorro, e de um punhal que trazia consigo, conseguiu. Em agradecimento, escoriou a jibóia e enviou a pele para o Santuário do Alívio, em jeito de ex-voto.
Algumas versões entendem que o homem se sentou realmente num tronco de árvore, e que este se transformou numa jibóia. Outras não relacionam o interveniente com o Brasil, afirmando que o episódio terá acontecido em Portugal – e neste caso, dificilmente terá ocorrido com uma jibóia.
As cobras da Casa das Promessas
O que é verdade é que, visitando a Casa das Promessas do Santuário do Alívio, no meio de um enxoval de oferendas à Senhora do Alívio, damos de caras com três compridas peles de cobra expostas que nem troféus junto à parede do fundo.
Aquela que é relatada na lenda é a que se encontra mais acima. As duas seguintes, igualmente extraordinárias mas ligeiramente mais pequenas, foram entregues por militares portugueses destacados para a Guerra do Ultramar, provavelmente como pagamento de promessa ou pedido de ajuda para regressarem sãos e salvos a casa. E por baixo das três, temos um lagarto (ou camaleão) embalsamado pendurado por fios.
Na parede lateral, outras cobras, desta vez de menores dimensões, são exibidas dentro de frascos. Estas foram também dadas à Senhora do Alívio. Segundo a Casa das Promessas, quem as entregou não exprimiu qualquer razão para o fazer.

As cobras da Casa das Promessas

Maria pisa a serpente
O simbolismo da Lenda das Cobras
Primeiro que tudo, devemos dizer que este fenómeno de expor peles de répteis em igrejas não é exclusivo do Santuário do Alívio. A título de exemplo, a Igreja da Penha de França, em Lisboa, também o fez, primeiro com peles, depois com versões modernas de uma cobra e de um lagarto, ambos em madeira. Os paralelismos com a Igreja da Penha de França não se ficam por aqui. Também ao templo lisboeta esteve associado um milagre Mariano, desta feita atribuindo à Senhora a salvação de um soldado na batalha de Alcácer Quibir. E só depois chegaram as lendas relacionadas com um homem adormecido e em perigo de vida dada a aproximação de um lagarto ou de uma serpente.
Alguns descortinam nesta oferenda de serpentes ou lagartos à Senhora uma alegoria, mesmo que inconsciente, para a vitória do bem sobre o mal. De acordo com alguma simbologia Católica, a serpente (ou outros animais ou seres com ela correlacionados, como o lagarto ou o dragão) é a representação do Diabo – veja-se, logo para começar, o episódio de Adão e Eva. As imagens que chegaram até hoje do Arcanjo São Miguel a derrotar o diabo encontram na Lenda das Cobras do Santuário do Alívio algumas semelhanças – curiosamente ou não, a vila de Soutelo, onde o santuário se encontra, tem São Miguel como orago. E já agora, a Lenda das Cobras encontra ainda maior correspondência quando observamos algumas imagens de Maria a pisar a serpente (sendo este caso uma interpretação Católica que ainda hoje gera controvérsia, nomeadamente entre os Protestantes, sobre quem realmente pisa a serpente – se Maria, se Jesus), aqui como a nova Eva, sem pecado, a vencer o mal.
Por outro lado, podemos admitir uma hipótese conjuntural que a liga a um culto ainda mais remoto, desta vez a Esculápio (ou Asclépio, usando a versão grega), Deus da Medicina e da Cura, que, como sabemos, se faz acompanhar de um bastão onde uma serpente se enrola. A serpente está intimamente ligada à ideia de regeneração e de cura, já que se livra da sua pele velha para se revestir de uma outra nova. Este atributo da cura que relacionamos com Esculápio foi, também ele, facultado à Senhora do Alívio, talvez para sobrepor uma imagem cristã sobre outra, mais antiga, de fundo pagão.

Acesso à Casa das Promessas
Vila Verde – o que fazer, onde comer, onde dormir
Vila Verde explica-se a si própria: para onde quer que se mire, é a cor que lhe dá nome que ataca os olhos. Estamos num dos mais longos vales do coração do Minho. Não admira que à nossa volta, debaixo de cada pedra, salte uma romaria. A ter de escolher, a de Santo António de Vila Verde ou a Feira dos Vinte da vila de Prado, são das mais concorridas.
E já que estamos na vila de Prado, terra em lugar prometido, numa das principais passagens do rio Cávado, leia-se um pouco sobre a fascinante história lendária da ponte que serve de papel de parede à Praia Fluvial do Faial. Um pouco a norte do vilarejo, e continuando no encalço do património lendário, temos o Penedo da Moura junto ao antigo castro, hoje popularmente conhecido como Monte do Castelo, ao qual só se acede com esforçada caminhada. E para nascente, uma nova lenda justifica um bizarro costume que deve ser comprovado na Casa das Promessas do Santuário do Alívio - à santa, é costume oferecerem-se cobras como ex-votos.
Mas vila verde não se percorre apenas entre montanhas. Na fronteira norte do concelho, há vila-verdenses serranos, a viverem nas sobras ocidentais do Gerês. Por lá encontramos uma pequena aldeia de nome Borges onde, segunda crença popular, um dente de São Frutuoso ajudava as povoações a curarem-se da raiva. E também na serrania vila-verdense tem lugar, no minúsculo povoado de Mixões da Serra, a famosa Bênção dos Animais, celebrada num livro e numa exposição fotográfica de Alfredo Cunha. Mais para sul, uma outra elevação foi equipada com torreão para defesa de um dos maiores apoiantes de D. Dinis na guerra civil contra D. Afonso IV - a Torre de Penegate.
Na gastronomia, não se pode sair de lá sem ir aos pratos elementares: as Papas de Sarrabulho (que têm uma versão especial na Feira dos Vinte), o Pica-no-Chão (do qual Vila Verde é capital), e o Pudim Abade de Priscos (cujo inventor aqui nasceu). Para ir ao melhor que o o concelho tem para entregar no prato, recomendam-se a Tasquinha do Cerqueira e a Toca do Lobo para as carnes. Com preço um pouco acima dos anteriores, mas famoso pelo bacalhau e pelo arroz de pica-no-chão (vulgo, arroz de cabidela), temos o Torres.
E para dormir, à cabeça, aparece a antiga Torre e Casa de Gomariz, actualmente revivida enquanto hotel de luxo, a Torre de Gomariz Wine & Spa Hotel. Mas há tanta oferta que podemos passar uma tarde inteira no processo de escolha. De portas recentemente abertas está o Recanto Nature, novinho em folha mas já com boa fama. Para casas, uma boa opção é a Casa Tarrio, a norte da sede de concelho, ou a Casa da Assudra, perto do Monte do Castelo.
Mapa
Coordenadas de GPS: lat=41.62683 ; lon=-8.43384