Festa das Luzes de Belmonte

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Se tirarmos Lisboa e Porto do mapa, Belmonte tem a maior e mais activa comunidade judaica do país. O Hanukkah, uma festividade que tem ganhado relevância no calendário religioso do judaísmo, é hoje celebrado como uma grande festa das luzes.
Os judeus em Belmonte
A vila de Belmonte teve, desde a sua existência, a sua quota de judeus sefarditas enquanto residente de longa data – são famosos os Cabrais de Belmonte, muito em particular um deles, conhecido de todos, Pedro Álvares Cabral. Relatos que chegam até ao século XIII subscrevem este dado, acompanhados pela certeza da existência de uma sinagoga. Aparentemente, a convivência destes com a população cristã nunca chegou a vias de facto, ao contrário do que se sabe acerca de outros pontos do país.
Ao longo do século XV, quando Belmonte recebeu judeus que atravessaram a fronteira em fuga dos Reis Católicos de Espanha, a comunidade foi aumentando. No final da centúria, contudo, o rei português D. Manuel I seguiu os passos do país vizinho, mandando perseguir todas as famílias judaicas que se recusassem converter ao cristianismo – algumas deixaram o país e rumaram a outros destinos, como a Holanda; outras ficaram, fingindo um culto que nunca realmente praticaram (ou acreditaram), criando o que agora chamamos de cripto-judaísmo.
O judaísmo em Belmonte manteve-se, assim, fiel ao seu passado, ainda que disfarçando os seus ritos (vem daí a história lendária da origem da alheira), e tendo a favor alguma cumplicidade e tolerância da vizinhança cristã, o que não evitou que alguns belmontenses fossem acusados de renunciarem Cristo.
Depois do duro período da Inquisição, que no total durou praticamente trezentos anos, os judeus nacionais puderam respirar melhor. Desde aí que os judeus de Belmonte vêm afirmando aquilo que por três séculos andaram a esconder. Uma dessas tradições vem à rua, todos os anos, no mês de Dezembro: a celebração, ainda que não exactamente nas datas correctas, do Hanukkah, a Inauguração.
O Hanukkah
Comece-se por dizer que o Hanukkah não é – ou não era – uma celebração maior do judaísmo. Comparado com, por exemplo, o Ano Novo, o Dia do Perdão, o Sukot, ou mesmo a Páscoa, o Hanukkah não passava de um pequeno cumprimento de calendário litúrgico. Há mesmo quem assegure que o Hanukkah não passa de uma réplica extemporânea da Festa das Cabanas que acabou por se tornar rotina.
Terá sido a coincidência temporal de estar colado ao Natal cristão (embora o Hanukkah possa acontecer ainda no mês de Novembro) que puxou a comemoração judaica ao estatuto mundial de que hoje goza. Em países onde a comunidade judaica tem forte penetração, como nos Estados Unidos, é comum desejar-se um Merry Christmas e ao mesmo tempo um Happy Hanukkah.
O Hanukkah festeja um evento anterior ao nascimento de Cristo, quando um grupo de judeus se revoltou contra o despotismo de Antíoco IV, rei selêucida da Síria, que obrigava o povo judaico a adorar os Deuses helénicos e montou no Segundo Templo (o Primeiro Templo seria, como sabemos, o de Salomão) um altar votivo a Zeus, Deus supra da mitologia grega.
A revolução foi liderada por Matatias e, após a sua morte, por Judas Macabeu. Passando à frente de alguma controvérsia e até exagero históricos, o consenso diz-nos que os judeus rebeldes conseguiram expulsar os sírios de Jerusalém e recuperaram o Segundo Templo, dando com ele parcialmente destruído. Segundo a lenda, a menorá, isto é, o candelabro que deve manter o templo iluminado, tinha apenas azeite para aguentar mais um dia aceso, mas o milagre aconteceu, e as velas mantiveram-se vivas por oito dias, tempo suficiente para que mais óleo fosse feito.
O Hannukkah dos tempos correntes alude a esse milagre do azeite, já que baseia a celebração no acender de oito velas, uma por dia, até que uma menora de nove braços esteja completa (oito braços simbolizando os dias, e um braço extra – o shamash – que guarda uma vela utilizada exclusivamente para afoguear as restantes).
A menora
Mais do que uma réplica da Festa das Cabanas, como alguns investigadores defendem, o Hanukkah parece-me mais uma óbvia divinização do sol – como acontece em todas as religiões, cristianismo incluído, por esta altura do ano. E a suportar isto está o objecto central na sua celebração: a menora.Chevalier, no seu “Dicionário dos Símbolos“, faz um paralelismo da menora com o sistema solar: “O tronco central simboliza o Sol, rodeado de cada lado por três planetas. É, portanto, também um símbolo do Logos, luz do mundo”. Aqui, referia-se à menora tradicional, de sete braços, não deixando, no entanto, de ter a mesma aplicação à menora do Hanukkah.É provável que quando o judaísmo festeja o Hanukkah, está na prática a celebrar o que outras religiões cumprem, mais ou menos na mesma altura do ano – o sol invictus, o retorno de um astro que a partir do final de Dezembro, no hemisfério Norte, torna a ganhar força. É a eterna vitória da claridade sobre a sombra, que o Natal cristão manifesta de outra maneira, substituindo o sol por Jesus, a nova luz.A Festa das Luzes de Belmonte
O nome festa das luzes vem a calhar para aquilo que se passa em Belmonte no mês de Dezembro. É, de facto, um enorme viva à luz que se faz: pelo Hanukkah, pelo Natal, e, mais do que tudo, pelo sol, que a partir do final do ano começa a conquistar tempo à noite.
Organizada através de uma parceria entre a Câmara Municipal de Belmonte e as Aldeias Históricas de Portugal, as datas da Festa das Luzes de Belmonte variam – já aconteceu ser antes de dia 25 de Dezembro, já aconteceu também ser depois.
Habitualmente, há uma introdução à celebração com o acender de cada uma das luzes da menorá gigante que se encontra na vila. A cada noite que passa, uma nova vela ganha brilho – assim é por um total de oito dias, tal como no milagre do azeite.
É por volta da quarta noite, quando se aproxima o fim de semana, que entra o festival propriamente dito, com workshops, teatro, concertos, mostras de gastronomia local, doçaria frita, jantares comunitários, exposições, lançamentos editoriais, visitas turísticas – e, óbvio, muita luz, como pode ser visto nos espectáculos de fogo ou nas iluminações das ruas.
Belmonte – o que fazer, onde comer, onde dormir
Situado na raia mágica beirã, Belmonte é o concelho mais a norte do distrito de Castelo Branco. Famoso pela sua cultura criptojudaica, resultado da perseguição de que os seus judeus sefarditas foram alvo, a vila tem hoje uma das mais activas comunidades judias do país. As suas festas, como a Festa das Luzes ou a Festa de Nossa Senhora da Esperança, em Dezembro e Abril, respectivamente, e os seus monumentos e museus, como a menorá, a sinagoga ou o Museu Judaico de Belmonte, reflectem essa ligação a um passado real mas escondido.
Ainda na vila, não podemos perder o castelo e a Igreja de Santiago, a judiaria circundante, bem como os restantes espaços museológicos (que são muitos e bons, tendo em conta a dimensão de Belmonte): o Museu dos Descobrimentos, o Museu do Azeite, e o Ecomuseu do Zêzere.
Fora da sede de concelho e de visita imperativa é o enigmático Centum Cellas, monumento que não encontra paralelo no país, nem na península, e que mais facilmente associamos a civilizações sul americanas, de origem pré-colombiana, transportando-nos para os mitos da Atlântida.
Para dormir, sugere-se a Pousada Convento de Belmonte, cuja piscina nos dá uma das melhores fotografias sobre a Estrela, ou a Casa Marias, bem situada e muito aconchegante. Na restauração, recomendam-se vivamente a Casa do Castelo (o borrego e o cabrito são demasiado bons para os dispensarmos) e, para quem está disposto a gastar um pouco mais, e o Convento de Belmonte Gourmet (cozinha de chef, na companhia de lareira e de uma bela vista de montanha).
Para mais dormidas no concelho de Belmonte, ver caixa de promoções em baixo:
Mapa
Coordenadas de GPS: lat=40.35868; lon=-7.35023