Enterro do Ano Velho
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Dizem todos, mesmo os tradicionalistas como eu, que os costumes nascem, vivem, e morrem. Alguns, esquecem-se muitos de acrescentar, ressuscitam. É o caso do Enterro do Ano Velho, moribundo no novo milénio, restaurado em 2014. Vivas à ressurreição.
Um renascido fim de ano
Como acontece em muitos outros lugares de Portugal, em Miranda socorrem-se de um boneco para representar uma especial altura do ano. Normalmente, como acontece nas Queimas do Judas ou na Serração da Velha, as figuras construídas simbolizam o Inverno, isto é, uma estação, e a sua destruição significa o término dessa passagem cíclica. Nesta caso, o simbolismo recai sobre um particular dia do ano – o último.
É de saudar. Numa hora em que as grandes metrópoles se enchem para assistir a fogos de artifício em tudo idênticos, sem qualquer marca identitária, descaracterizados e dissolvidos na gigante vaga globalizante, Miranda do Douro, para não variar, vira-se para si – para o seu passado cultural, tornando-o presente (e a tradição, como se canta, é agora).
Nas noites de 31 de Janeiro que são, por regra, geladas, chegando mesmo às negativas em temperatura (há, aliás, um festival mirandês com o nome de Geada que coincide com a data de fim de ano), grupos de pessoas, novas e velhas, saem para o Largo do Castelo para verem o cortejo fúnebre: padioleiros com uma máscara branca e límpida mas capaz do mais agudo dos calafrios, carregam um boneco de tamanho humano como se de um morto se tratasse, parando a caminhada no Lhargo D. João III. Aí, após um breve e pouco saudosista discurso de despedida ao ano que finda, aquela figura sem cabelo, roupa de trapo, e aspecto desgastado, é queimada. Em torno, as gentes da terra mandam fora todas as más memórias que os últimos doze meses lhes trouxeram.
Vêm então as gaitas-de-fole de miranda e as caixas e os pandeiros animar o resto da noite. Aplaude-se o novo ano e brindam-se copos ao futuro.
Simbolismo do Enterro do Ano Velho
Uma boa parte disto, nomeadamente a queima, isto é, a expiação pelo fogo, vem dos rituais solsticiais, muitos deles – diria que a vasta maioria – celebrados ainda de forma marcadamente pagã na província de Trás-os-Montes.
O arder do Velho, como o pegar fogo às lembranças pouco felizes que o ano antigo trouxe, têm qualquer coisa de purificante – o abandono do relho que antecede um renascimento (como o povo diz: ano novo, vida nova). A fogueira é, assim, uma transformação do passar dos anos numa fénix, que sempre morre, e que sempre torna a nascer.
O mesmo fogo está também intimamente ligado ao sol, que no solstício de Inverno renova o seu ciclo, fortalecendo-se daqui para a frente, até atingir o seu ponto máximo no solstício de Verão. Esta conexão que as festas populares fazem entre a fogueira comunitária e o astro que nos aquece tem projecção nos vastos madeiros observáveis em distantes pontos do país, quase todos na noite de 24 de Dezembro. Estamos aqui, portanto, na presença de um outro madeiro, atrasado por dez dias, e com uma variante: a introdução da figura do Velho, lânguido e imprestável, pronto para a morte.
Miranda do Douro – o que fazer, onde comer, onde dormir
Miranda do Douro e o seu planalto são, a par com algumas manchas do Algarve, das zonas mais diferenciadas do país. A sua cultura, partilhada em parte com a asturo-leonesa, distingue-se de praticamente tudo o que vemos no resto do país, começando, logo à cabeça, pela Língua Mirandesa, ainda usada como forma de comunicação em algumas aldeias do concelho. Mas há muito mais: os burros, as capas de honras, as gaitas e as flautas, os pauliteiros, as postas, as alboradas, os festivais... tudo isso é merecedor de ser admirado com tempo.
E é assim, sem olhar para o relógio, que se recomendam sítios como o Puial de l Douro com vinha própria e vista para a Sé (aproveite-se também para visitar o Menino da Cartolinha), a Casa de l Cura que conta com extras como salão de jogos e piscina, a lareira comum das Casas Campo Cimo da Quinta, ou o enorme bom gosto da Casa de Belharino.
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Mapa
Coordenadas de GPS: lat=41.496; lon=-lon=-6.27524