Serra da Gardunha

by | 20 Set, 2017 | Beira Baixa, Lugares, Natureza, Províncias, Serras e Vales

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Miradouro para a imponência da Estrela, a norte, e para o início da planura alentejana, a Sul: é a Serra da Gardunha, um poema que a natureza escreveu à Beira Baixa.

Da Gardunha temos o completo retrato de Portugal – o do norte, acidentado, e o do sul, amainado. Todo ele se vê de lá do cimo.

As duas faces da Gardunha

Como quase todas as serras que se estendem no sentido Este-Oeste, há vincadas diferenças entre a vertente norte e a vertente sul da Serra da Gardunha.

Não só de paisagem, mas também de costumes e até de fenótipo das suas gentes (Vítor Martins, que lá tem raízes, diz que encontra, do lado do Fundão, beirões de “tez clara, loura e de cintilantes olhos azuis”, por oposição à encosta oposta, onde os locais são mais morenos – ou por outra, mais alentejanos.

Acontece em todo o lado onde um percalço da Terra impõe obstáculos ao Homem: já Mattoso diz que na Serra da Estrela, bem aqui ao lado, há dois povos, o da encosta norte e o da encosta sul, que mal comunicam entre si.

Mas indo apenas àquilo que se vê a olho nu, isso só já basta para separarmos águas.

A Gardunha nortenha espreita a grandiosidade da Estrela e dos seus contrafortes, mas daqui até lá vai um longo e amplo vale, a Cova da Beira, onde bosques de castanheiros e de cerejeiras governam. É o verde que predomina, o da terra fértil que segue do Fundão até aos inícios serranos da Covilhã, e o dos pinheiros – por vezes, carvalhos -, que pelo Outono dão um acastanhado deslumbrante à tela. Na Primavera, o quente amarelado das giestas chega em Abril. Indo à Portela de Alpedrinha temos uma enorme janela para tudo isto.

Na face meridional, a cor muda. A pedra multiplica-se, e multiplica-se em exponência. É um chão bruto e seco, apenas pontuado no sopé, quando a templária aldeia de Castelo Novo resolve mostrar que é possível que haja quem aqui more. Vegetação tímida e pouco mais que rasteira vai dando uma alternativa ao cinzento do granito – mas pouca, normalmente vinda de protuberâncias de um verde seco, os codeços. Os ares do alentejo estão lá, nos sítios onde ainda vemos sobreiros de boa saúde.

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Grupos de caminhantes passeiam pela Serra da Gardunha

Passeios na Serra da Gardunha

Uma Serra fronteira?

É da Penha da Senhora da Serra, o cume granítico da Serra da Gardunha, que temos uma boa síntese dos dois portugais, o do norte e o do sul – porque o do centro é designação mais recente, e no fundo significa tudo o que não encaixa completamente em norte ou sul.

Se um dia se quiser perceber estes dois lados do espelho que é Portugal, venha-se aqui – suba-se ao ponto mais alto da Gardunha, e temos isso numa viragem de trezentos e sessenta graus.

De lá, da Penha que aponta o dedo a Deus, mirando horizontes a sul, temos a planície sem fim do alentejo, apenas cortada por uma ou outra elevação, destacando-se, contudo, a rigidez de Marvão. Olhando a norte, temos um microcosmo do norte português – montanhas abruptas, como ondas em maré brava, intercalados com vales de terra fecundante.

É o fim do casario de piso singular e cores garridas. E o começo dos lares de pedra, onde o granito (ou o xisto) dá robustez às argamassas. Tudo isso pode ser visto na linha cimeira que separa a encosta norte e a encosta sul da Serra da Gardunha, um autêntico summit, usando palavra em voga, de geografia portuguesa.

Montes de Cereja

Há poucas paisagens tão eloquentes na transmissão visual de beleza como a da Gardunha quando chega as cerejeiras ganham flor.

Nesse quadro nipónico onde o branco macio da flor da cerejeira vai pintalgando as encostas desta serra da raia, perde-se o fôlego e apura-se o sentido – ou os sentidos, porque viajar não é só ver, e aqui, sobretudo aqui, há tanto para cheirar.

Esta é a linha de montagem das cerejas que alimentam o país. Sendo de grande ou pequena quantidade, coisa que varia consoante os rigores do clima e as tragédias dos incêndios, a verdade é que nunca deixa de ser boa.

E se a querem conhecer recém-nascida, é ir até lá, quando as cerejeiras ainda rodam os seus ramos como saias, ou dormirem uma noite junina em Alcongosta onde todos os anos se dá a Festa da Cereja.

Neve no topo da Serra da Gardunha

A Serra da Gardunha acima das nuvens, com as neves invernais

As pedras mágicas da Gardunha

A Serra da Gardunha, como de resto a maioria das elevações de toda a Beira interior, Alta ou Baixa, é rica em figurações pétreas, sobretudo do lado sul, onde o granito mais se sente.

O granito, como rocha resistente que é, dá para isto: põe o vento como um grande e imortal artesão. A tela que é a serra é composta de inúmeras de peças que nem o homem, com toda a sua imaginação, seria capaz de esculpir.

São vastas as designações que o povo foi dando a certos afloramentos curiosos : o Cabeço do Galo, uma rocha de asas abertas com uma silhueta que lembra a de um galo ou de uma águia (ver foto em baixo); duas obras que nos remetem para o mito dos Gigantes, como a Cabeça do Gigante, que parece levar bigode abaixo do pronunciado nariz, e o Crânio de Gigante, arredondado e de uma perfeição espantosa; a Pedra Basculante, um dos muitos exemplos de Pedras Baloiçantes que o país tem; a pirâmide de granito que é feita na Penha; um ET vindo directo do filme de Spielberg, próximo da ribeira de Alpreada; as partículas do Cabeço dos Corvos… e tanto mais por descobrir quanto aquilo que está por desenhar.

Uma das muitas curiosas pedras da Gardunha

Lenda da Serra da Gardunha

Não existe apenas uma lenda, mas esta é a mais famosa e, por isso, a que aqui vem à baila.

Já a ouvi contada de duas formas, numa tendo os romanos como povo invasor, noutra tendo os mouros nesse mesmo papel. É a maleabilidade característica das lendas, que mantêm a essência da narrativa, adaptando-a sazonalmente conforme os contextos históricos. Mas vamos reduzir-nos à segunda versão, sabendo que da primeira para a segunda mudam pouco mais do que nomes.

Um homem nobre de Idanha-a-Velha tinha uma filha de um primeiro casamento. Contudo, depois de viúvo, tornou a casar com nova mulher que, como é frequente acontecer nestes dramas de família, repudiava a filha do seu esposo.

A pequena vivia assim solitária, tendo como único amigo um cão. Mas até o cão era vítima do mau carácter da madrasta.

Durou isto tanto tempo, ainda por cima com os maltratos sempre em crescendo, que a rapariga se fartou e fugiu.

Sem grandes planos, olhou para o cimo de uma serra e decidiu por lá exilar-se na companhia do seu amigo.

Correram em direcção ao topo do monte e por lá encontraram uma cavidade no meio de vários penedos. Decidiram fazer da lapa um abrigo, e por lá pernoitaram.

Na manhã seguinte, a menina sentiu-se acordada por um toque de alguém. Olhou em volta e viu no fundo da lapa uma luz, de onde mais tarde saiu a Senhora. Surpreendeu-se com a aparição e ainda mais com o recado que tinha recebido: ela que voltasse à sua Idanha e avisasse seu pai de que os Mouros aí vinham.

Assim foi feito, e o pai disse ao povo de Idanha que se resguardasse na serra onde a Senhora tinha aparecido, porque os sarracenos estavam à porta e traziam todo o mal com eles.

Os Mouros, chegados a Idanha, nada viram, decidindo depois subir a colina que ali estava ao lado. Foram batidos pelos aldeões que lá se protegeram, estando em posição privilegiada no ataque. E diz-se que Gardunha vem daí, o monte que “guardou” os de “Idanha”. 

No sítio onde a Senhora apareceu foi construída uma capela, a Ermida de Nossa Senhora da Serra, cujos vestígios ainda podem ser vistos, na Penha da Serra da Gardunha. A lapa existe, e encontra-se bem lá no alto, para que apenas a veja quem se der a esse esforço.

Lapa lendária a quem se atribui o avistamento da Senhora

A lapa onde, segundo a lenda, apareceu a Senhora com o aviso da chegada dos Mouros a Idanha-a-Velha

Hotéis e Glamping na Serra da Gardunha

Para a pergunta de onde ficar na Serra da Gardunha há várias e boas respostas. Dependerá do que se quer.

Na encosta sul, na aldeia histórica de Castelo Novo, encontra-se a Casa do Balcão, de molde típico da Beira Baixa, perfeitamente enquadrada na tonalidade acinzentada desta terra de Templários. Bem perto, um pouco mais para Este, sobressai o Carvalhal Redondo – Farm House, uma ampla quinta com casa tradicional mas de linhas modernas.

Entre as duas encostas, no ponto de viragem que é feito em Alcongosta, temos o Natura Glamping, já famoso pelas suas tendas que mais parecem ovnis (ver imagem em baixo). Tem localização privilegiada.

Por fim, já na encosta norte, nas Donas, a poucos minutos do Fundão, a Casa Entre Serras vai buscar o seu nome por se encontrar entre a majestosa Estrela e a Gardunha – simples e afável, e com entrada permitida a animais de estimação.

Mapa

Coordenadas de GPS: lat=40.08063 ; lon=-7.5264

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