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Há uns tempos o Carlos Carneiro escreveu um extenso e recomendado artigo sobre os tipos de Carvalho em Portugal. Deixou de fora, intencionalmente, o Sobreiro, que também é um Carvalho. A razão para o ter feito prendeu-se com a especificidade e importância que o Sobreiro tem na vida nacional, merecendo um artigo à parte que agora se escreve.

Também conhecido por chaparro no linguajar alentejano, o Sobreiro é, por lei e por espírito, a árvore nacional. Por lei porque assim foi formalizado, com unanimidade de votos, na Assembleia da República. Por espírito porque assim o têm os portugueses, sem que seja preciso qualquer propaganda a esse respeito.

Árvore frondosa

Inconfundível aos olhos de um português, é comum dizer-se que o Sobreiro cresce para cima e para os lados, o que lhe confere um porte carregado, de ramos volumosos e horizontais e de copa adensada pela folhagem perene. Todavia, esquecem-se de um terceiro sentido: o Sobreiro cresce com toda a força para cima e para os lados, de facto, mas cresce também para baixo com um vigor pouco habitual. Facilmente reparamos nos seus 15 ou 20 metros de altitude (ou mesmo 25, mais raramente), mas pouco sabemos acerca das suas profundas raízes que serpenteiam por espaços subterrâneos à procura de água, como se a sede fosse uma emergência.

Os seus frutos, pequenas bolotas de formação cilíndrica semelhantes às da azinheira mas com uma espécie de chapéu a cobrir um dos seus lados, são facilmente encontrados no chão que mora à sua sombra.

A sua longevidade depende do uso que lhe derem. Se for descascado regularmente para fornecimento de cortiça, dura entre 150 e 200 anos, dificilmente mais do que isso. A sua velhice poderá estender-se por bem mais tempo caso viva livre de desbastamento. No entanto, a partir de certa altura, torna-se vítima da sua própria robustez, e não consegue sacar dos parcos solos onde se encontra recursos suficientes para a sua sobrevivência.

Exercita-se sobretudo nas estações que espevitam a flora, ou seja, na Primavera e no Verão, resguardando-se nos meses frios, limitando as suas funções ao essencial. É, portanto, nos meses quentes que regenera a sua casca e desenvolve o seu corpo.

Um casamento feliz para sempre: sobreiro e alentejo

Um majestoso Sobreiro na planície ibérica

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Distribuição do Sobreiro

O Sobreiro encontra-se maioritariamente na zona mediterrânea, seja sul europeia, seja norte africana. Além disso, e apesar de conseguirmos dar com eles em países como Grécia ou Albânia ou Itália, é evidente a sua maior concentração na ponta ocidental da Europa (Espanha e Portugal) e de África (Marrocos, Argélia, Tunísia).

Em Portugal, em linha com a preferência que tem com terrenos pouco acidentados relativamente próximos do mar, podemos dizer que ele é tão mais frequente quanto mais para sul estivermos. O Alto Alentejo e o Baixo Alentejo são províncias onde ele é omnipresente, mas também o Ribatejo e mesmo certas partes de Trás-os-Montes podem ser consideradas terras de sobro. Apresenta-se sob a forma de montado (uma floresta pensada e executada pelo homem, onde o Sobreiro pode viver a solo ou alternar com outras culturas como a da Azinheira ou a do Pinheiro-Manso) ou de forma espontânea.

Escasseia apenas no Minho e em certas áreas onde não se dá bem – as encostas de grande altitude viradas para norte, que ocorrem, quase sempre, do Tejo para cima; e as de terrenos calcários, deixando assim de fora os maciços calcários de Condeixa-Sicó-Alvaiázere, da Serra de Aire e Candeeiros, de Montejunto, da Arrábida, e de Faro.

Uma floresta de sobreiros, mais conhecida por Montado

Montado, a floresta de sobros

A cortiça

Contrariamente ao que é normal, o ouro do Sobreiro não está na madeira (que é demasiado dura) ou no fruto (comido por suínos e pouco mais), mas sim numa parte quase sempre ignorada no corpo arboral: a casca, que entre nós é vulgarmente conhecida por cortiça.

É essa camada porosa, leve, impermeável e flexível que transforma os montados que se espraiam nas planícies alentejanas em gigantes mealheiros nacionais. Portugal é, sabemos, o maior produtor mundial de cortiça, sendo quase toda a produção encaminhada para fora do país. A sua incomparável qualidade como matéria isoladora fá-la ser cobiçada em vários mercados. Os fins da cortiça, enquanto matéria-prima, são muitos, mas o mais conhecido é, claro, o das rolhas usadas na indústria do vinho.

O descortiçamento é feito na Primavera e no Verão, nos meses secos, quando a casca salta facilmente do tronco da árvore. Acontece, normalmente, de nove em nove anos: os números que vemos, pintados nos seus troncos, não são mais do que isso – a contagem dos anos até ao próximo desbaste. No entanto, até aos 25 anos de idade, o Sobreiro está livre dessa poda, entendendo-se que está em período de crescimento. Depois disso, estará em crescente fornecimento até perto do seu centenário, altura em que começa a decair.

A retirada de cortiça é feita à antiga, com um machado, e, passe o paradoxo, com machadadas delicadas, de modo a cortar apenas a pele e não o tronco. O tronco é essencial à regeneração da cortiça, e de resto à sobrevivência da árvore. A primeira extracção tem o nome de desboia e a cortiça que daí resulta é tida como de pouca qualidade por ser pouco flexível, servindo apenas certos fins como o de matéria isoladora ou material para revestimentos. A secundeira, nome dado à cortiça da segunda extracção, não regista melhorias significativas. É preciso uma terceira extracção, quando a árvore conta com praticamente 45 anos de idade, para obter a amadia, cortiça maleável que servirá para a produção de rolhas.

A árvore sustentável

O fornecimento de cortiça está longe de ser a única função. As folhas são bons fertilizantes. A bolota, além de servir para alimento de porcos e javalis, dá matéria para fabrico de determinados óleos gastronómicos. A madeira, cuja dureza impede que seja trabalhada de forma artística por artesãos, dá óptima lenha, sendo também usada no fabrico de objectos que tenham a rigidez como condição.

Além de todos os produtos que origina, suberosos e não só, o Sobreiro é responsável pela manutenção de ecossistemas de elevado valor florístico, faunístico e ecológico, sendo de realçar a sua enorme capacidade de resistência ao fogo – característica que nunca é demais relembrar tendo em conta o país onde estamos, altamente inflamável.

A nível turístico, é responsável por muitos espaços de turismo rural, apoiados na sustentabilidade dos montados de sobro típicos do sul do país. Ainda a este respeito, Portugal viu um dos seus exemplares reconhecido em 2018 como a Árvore do Ano: está em Águas de Moura e até tem nome – o Assobiador.

Como já se escreveu, nenhuma árvore dá mais exigindo tão pouco. Uma fénix lusitana que não pára de nos dar milagres, digna de culto mariano.

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