Santuário de Nossa Senhora da Candosa
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Entre Góis e a Lousã, numa altura em que um cume quartzítico se alevanta à nossa frente, apercebemo-nos de uma capela, também de um coreto, e de toda a crença em torno de um lugar que se revela, enfim, um santuário – o Santuário de Nossa Senhora da Candosa.
O cerro da Candosa
Quase todos os lugares escolhidos pelo clero para montar uma casa sua têm um elemento em comum: a beleza da envolvência. Isto torna-se duplamente verdade quando fugimos dos meios urbanos. No campo, são o topo dos montes, as beiras dos promontórios, as ribas dos cursos de água, os amplos miradouros que completam os requisitos para que sejam considerados lugares sagrados.
Muitos deles, diria que a maioria, já eram sagrados antes de ermidas, igrejas ou mosteiros os transformarem em pontos de encontro cristãos. Assim aconteceu, com quase certeza, com o Cerro da Candosa: uma colina feita em quartzo que o rio Ceira, num trabalho quase impossível e de imbatível paciência, foi furando.
É na ermida que se alça na penedia que, a 15 de Agosto, por tradição o dia de referência nas festas agostinhas, se juntam as gentes de cá, numa celebração colectiva à sua Senhora. Fora dessa data, serve o cerro para outras actividades: piqueniques, correrias de miudagem, ensaios coreográficos, incursões de BTT, e namoros – muitos namoros, dizem até que a maioria dos garotos que aqui vivem foi feita nestas imediações.
Em torno, a vegetação. As mimosas a rebentar amarelos com a ajuda de giestas, se a época for de floração. E as urzes serranas, claro, que se aguentam bem a ambientes ventosos como este. E o curso do Ceira a montante, a agarrar um ribeiro que lhe dá a mão para, com a pujança das correntes invernosas, ganhar o seu espaço na pedra dura.
A ermida da Senhora da Candosa
A lenda da Senhora da Candosa
Dizem os locais que bem à beira do monte actualmente conhecido como o da Candosa vivia um mouro. Mouro, quer dizer, um mouro convertido à fé cristã. E que era ele muito abastado, explorando ouro no rio, colhendo frutos de várias árvores, trabalhando em prolíficas terras agrícolas.
Numa altura em que os sarracenos ainda predominavam nesta zona da península, nada poderia causar mais inveja. Primeiro, um homem tão afortunado que fazia todos os outros parecerem pobres. Segundo, um homem dos seus que renegou o Deus do Islão se entregou ao Deus do inimigo.
A invídia ganhou contornos de malvadez quando um outro mouro, com um certo poder na região, resolveu projectar a construção de um muro de pedra e terra, impermeável ao curso do Ceira, que obrigasse a água a acumular-se a montante, alagando solos e, por fim, afogando o cristão-novo.
Assim foi, e durante dias, com a ajuda fervorosa de outros defensores da causa islâmica, o muro foi-se fazendo, grosso, de alicerces fundos, intransponível. Todos se preparavam para finalizar aquela enorme parede e estancar o avanço da corrente. No entanto, numa noite de descanso, algo aconteceu. Não se sabia bem porquê, mas na manhã seguinte não havia muro. Todas as pedras vieram parar ao chão, e o rio Ceira corria livremente.
O mouro, embora furioso, não desistiu, e tornou a chamar as suas tropas para que uma nova barreira, ainda maior, fosse construída. Novamente, o muro foi erigido. E novamente, numa noite, sem razão aparente, caiu.
À terceira vez o mouro não quis ouvir mais desculpas. Prendendo quem achava irresponsável ou possivelmente culpado das desfeitas anteriores, seleccionando os seus melhores homens e chamando outros mais, edificou uma autêntica muralha. Coisa digna de castelo. Foi para casa no último dia de trabalho, com a certeza de que desta vez não haveria falhas. E nessa noite teve um sonho que nunca lhe tinha passado pelo sono. Uma senhora, sentada num burro, passeava morosamente pelo muro, e por cada passo dado pelo burro, pedras atrás caíam, sem esforço, como que por magia. Acordou sobressaltado o mouro e pôs-se a caminho da sua obra. Quando lá chegou, viu a mesma senhora com que tinha sonhado. Os seus pés colaram ao chão e não conseguiu aproximar-se dela. O muro, tal qual como previra o seu inconsciente, desabava à passagem da mulher sentada no animal. Não tinha dúvidas que estava na presença de um milagre, e no dia seguinte, humildemente, foi ter com o cristão novo para lhe dizer que queria adorar o seu Deus. E juntos, construíram uma capela no cimo do monte.
Conta-se que as pegadas do burro lá estão, na pedra, junto ao miradouro.
Significado da lenda da Candosa
Não há grandes dúvidas de que estamos perante uma lenda pedagógica, de conversão à fé que, historicamente, na Península Ibérica, venceu: o Cristianismo.
O facto de o mouro se ter deixado convencer através de um sonho deixa antever que para que alguém se converta à nova fé cristã basta isso mesmo, uma revelação interior – uma luz, e daí poderá vir o nome candosa, corruptela possível de candeia.
Ficam ainda menos dúvidas da tendenciosidade da lenda quando, de acordo com a narrativa, associamos a inveja e a crueldade ao mouro não convertido, e a boa fortuna (bem como o perdão) ao cristão-novo – para bom entendedor, a conclusão é simples, passe-se para cristianismo e a vida correr-nos-á melhor.
Mas para além do seu carácter educativo, que é inegável, a lenda da Candosa solta uns rumores de antigos cultos – talvez à água, talvez à pedra, talvez a ambos ou a outros. O que sabemos é que muitos lugares onde se podem avistar fossas que, segundo crença popular, são pegadas de animais sagrados ou pegadas de animais salvos milagrosamente (e de cabeça lembro-me do Senhor da Pedra, da Senhora do Salto, da Senhora da Nazaré) se transformam quase automaticamente em lugares mágicos, destinos de romarias ou de festas profanas.
Góis – o que fazer, onde comer, onde dormir
O concelho de Góis é conhecido pelas aldeias de xisto que alberga. Das várias que poderíamos aqui falar, destacamos a de Aigra Nova e a de Aigra Velha, bem lá para cima, na Serra da Lousã.
Qualquer altura do ano é boa para as visitar, mas recomendamos uma visita no Outono, pelas cores e bramas dos veados-vermelhos, ou pelo fim de semana do Carnaval, com o seu imperdível Entrudo de Góis. Fazemos notar que, quer a Portantiqua Guesthouse (lindíssima moradia com bicicletas disponíveis para passeio), quer a Casa Banda de Além (uma fenomenal casa recuperada em Aigra Velha), são de poiso obrigatório.
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