Vinho de Talha – Entrevista a Manuel Bio

by | 22 Mar, 2023 | Alto Alentejo, Baixo Alentejo, Gastronómicas, Províncias, Tradições

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É com gosto que dizemos à boca cheia que o Vinho de Talha, em Portugal, nasceu, penou, resistiu, e revigorou. Culpem essa enorme planície sem sombra chamada Alentejo pela resiliência.

O Vinho de Talha traz-nos uma história milenar do aquém e além Guadiana. Para falar dela temos Manuel Bio, CEO da Abegoaria e presidente da Cooperativa da Granja, numa curta mas esclarecedora entrevista, a quem damos o nosso obrigado. Embalados nos agradecimentos, aproveitamos também para tirar o chapéu ao Jorge da Taberna do Liberato, em Moura, pela ajuda.

Para quem não faz qualquer ideia do que um Vinho de Talha é, consegue resumi-lo em poucas palavras?

[Manuel Bio] É um Vinho de qualidade produzido por processo e protocolo com mais de 2000 anos e que passou de geração para geração de forma oral, com tecnologia e consumo de energia não humana quase inexistente.

Fala-se muito da origem romana do Vinho de Talha. Depois disso, houve na chegada da cultura sarracena ou norte africana alguma influência na forma como é feito?

Os Sarracenos locais continuaram a produzi-lo e a consumi-lo localmente e a manter o conhecimento técnico da produção do mesmo.

Em algum momento da sua história, o vinho da talha esteve perto da extinção?

O Vinho de talha praticamente desapareceu de Espanha e Itália. Na Geórgia e em Portugal, principalmente em Vila de Frades, Vidigueira e Cabeção, sempre se manteve a tradição e felizmente nos últimos anos tem ganho novo dinamismo e novos interesses. Cada vez mais é um produto cultural e muito mais que um simples vinho de mesa…

Uma das talhas ganhou o nome de “ladrão”. De onde é que isto vem?

Sim, o famoso ladrão das adegas de talha é uma talha que está enterrada no chão da Adega e para onde escorrem os líquidos do mesmo. E para que servia? No pico do processo fermentativo do vinho, onde se tem de mexer as massas das talhas 3 ou 4 vezes ao dia, se havia um descuido e isso não era feito, a mesma jorrava o vinho para fora e entornava parte do mesmo… e lá estava o ladrão para o recuperar. Ou se uma talha se partisse devido ao calor da fermentação, o que era menos frequente, lá estava o ladrão para roubar, isto é, recuperar, o néctar dos deuses.

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A fermentação na ânfora ocorre por cerca de quinze dias. Depois disso, ou é servido directamente do pote nas tabernas, ou é armazenado numa nova talha e por lá amadurece mais tempo. De que maneira estes dois processos alteram o sabor do vinho?

O sabor não altera, evolui como em todos os vinhos. Se ele estiver são e equilibrado, vai melhorando com o estágio… se tiver ficado por terminar e assim que chegar o calor da primavera, vira vinagre, vulgo ia para Barrancos!

Ainda há tabernas a fazer o seu próprio vinho de talha?

Sim, hoje ainda temos em várias localidades do Alentejo tabernas a fazer o seu vinho de talha.

Há castas predilectas quando se faz um vinho de talha?

Normalmente as castas antigas da região. E a razão é simples, são castas adaptadas ao terroir e com leveduras indígenas preparadas para fazer fermentações a altas temperaturas e características do Alentejo.

Vinho de Talha e Cante Alentejano? Estão de alguma forma ligados? O dia de prova do novo Vinho de Talha é acompanhado pelas vozes polifónicas do sul?

As tabernas sempre foram o palco do Vinho de Talha e do Cante Alentejano. São claramente um produto único e impossível de pensar neles em separado!

ainda temos em várias localidades do Alentejo tabernas a fazer o seu vinho de talha

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