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Foi no início do século XX que se destapou uma antiga urbanização numa colina a cerca de 5 quilómetros da Póvoa de Varzim. Poderiam tê-la chamado de Castro de Terroso, ou Citânia de Terroso, mas a designação que ficou foi mesmo Cividade de Terroso. A descoberta não era propriamente uma novidade. É comum termos os outeiros do noroeste português coroados com fortificações civis que remontam aos finais da Idade do Bronze e a toda a Idade do Ferro, despois mescladas com a influência de Roma.

É a Cividade de Terroso apenas mais um exemplo indistinto dos inúmeros casos de cultura castreja que grassam pelo norte de Portugal e pela Galiza? Não exactamente. As escavações de Rocha Peixoto, durante 1906 e 1907, e as seguintes, quase oitenta anos depois, em 1980, por Armando Coelho Ferreira da Silva, às quais podemos desde já juntar as que estão acontecer neste momento com patrocínio da Câmara Municipal, mostram particularidades que fazem sobressair esta pólis de muitas outras, até de algumas de maior dimensão.

Adenda: boa parte dos objectos encontrados pelos arqueólogos que trabalharam por aqui estão expostos no Museu Municipal da Póvoa de Varzim, onde uma sala é exclusivamente dedicada ao castro poveiro, e aqui ao lado foi montado um núcleo interpretativo que funciona como complemento à fortificação e ao museu, onde uma casa castreja foi reproduzida de acordo com as ruínas que sobraram e os achados desvendados.

A individualidade da Cividade de Terroso

Bastaria agarrar-me a uma questão técnica – o achado de uma composição funerária, semelhante ao que hoje chamaríamos de cemitério – para destacar a Cividade de Terroso em relação à larga maioria das suas congéneres. Gonçalo Artur Cruz, em 1917, tendo por base as escavações ocorridas dez anos antes, falou de “sepulturas circulares a modo de poços […] por vezes em dois pisos por meio de uma lousa interposta”. Com efeito, são escassíssimos os exemplos de castros onde se vê tal coisa.

Mas mais do que isso, aquilo que mais impacta na Cividade de Terroso, e isso pode ser sentido apenas ao visitá-lo, é a aparente desordem urbanística. Vista de cima, em planta, a forma como as casas se amontoam, encostadas umas às outras, como se não houvesse espaço para tanta cama, leva-nos a pensar que esta gente dormia com a respiração do vizinho em cima. Pior: à primeira vista, mal reparamos na presença de uma rua, de um caminho, de uma trilho, que disponha alguma regra na arquitectura civil do povoado.

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Mas, pegando na certeira observação de Saramago, o caos é uma ordem por decifrar. Se deambularmos pela labiríntica acumulação de casas desemaranhamos duas avenidas, uma de sul para norte, outra de ocidente para oriente, bem mais óbvias do que seria de supor para quem olha para o castro de fora das muralhas ou mesmo para quem o mira de cima. E assim nos apercebemos de quatro divisórias correspondentes aos quatro cantos cardeais: a sudeste, a nordeste, a sudoeste, a noroeste.

O mesmo acontece com a errada percepção de que o casario foi levantado sem critério. Uma das placas informativas faz a reconstituição de um lar castrejo em Terroso e facilmente conseguimos descodificar as divisões de um polo familiar, onde cinco unidades fechadas de planta circular (destinadas às dormidas e às refeições) gravitam em torno de um pátio comum, aberto, este último o lugar de maior socialização e de trabalho. Cada núcleo separar-se-ia da via pública por uma porta com fechadura – veja-se como a necessidade de privacidade vem desde a proto-história.

A circundar o povoado estava a muralha defensiva, neste caso uma dupla muralha granítica, onde se caminha folgadamente no espaço intercalar. A muralha interior é claramente mais perceptível do lado nascente, poente, e meridional. No eixo setentrional, onde o declive é mais ríspido, o muro defensivo é pontual porque a própria natureza funcionaria como protecção. E há mais muralhas, provavelmente construídas com o aumento da população, de figuração diferente, em boa parte por estarem em zona de maior inclinação.

Ao longe, olhando para norte, vemos a Serra de Rates e o seu ponto máximo, o Monte de São Félix. Também aí se descavaram ruínas de casas castrejas, um conjunto hoje chamado de Castro de Laúndos, presentemente assumido como um bastião da Cividade de Terroso, o que só mostra a complexidade da malha urbanística pré-romana no território interior da Póvoa de Varzim.

História da Cividade de Terroso

A Cividade de Terroso deverá ter sido ocupada, numa primeira fase, entre o século XI e V antes de Cristo, embora de forma intermitente. A partir do século V antes de Cristo, os povos da planície encostados ao mar começaram a deslocar-se definitivamente para os montes, e a justificação maior deverá ter sido a guerra – porquê abandonar os campos férteis próximos ao Atlântico se não por ameaça, e que melhor vantagem bélica se pode ter do que estar na vantajosa posição do topo de um cerro? Terá sido por esta altura que as casas foram montadas, como necessidade de povoar o monte de modo permanente.

Certo é que a pesca nunca deixou de ser parte do quotidiano dos homens castrejos da Póvoa, mesmo quando já se encontravam relativamente distanciados do mar. À faina aliaram a agricultura, a mineração, o pastoreio, e, em menor grau, a caça. O mar era também ponto de encontro com as culturas do Mediterrâneo, com quem Terroso tinha relações comerciais, sendo os metais e a cerâmica aquilo que os de fora mais cobiçavam.

Foi sobretudo isto, o labor dos mais diversos metais fornecidos pela Serra de Rates – o ouro, a prata, o ferro, o cobre, o chumbo, o estanho – que chamou a atenção de um império formado no Lácio que se vinha instalando na península gradualmente, pelo leste e pelo sul. Assim que Roma conseguiu desmontar as tribos lusitanas, espécie de tampão para o avanço até ao noroeste ibérico, estava aberto o caminho aos legionários que pretendiam as serras ricas em minérios da bacia do Douro.

Sendo certo que o território que englobava o que hoje chamamos de Norte português somada com a Galiza foi um dos últimos cantões ibéricos a ser romanizado, não é menos certo que a romanização acabou por acontecer logo que as legiões venceram as tribos celtas (ou mesmo pré-celtas) aqui instaladas há centenas de anos. Os vestígios da romanização, cujo início deverá rondar a década de 130 antes de Cristo, podem bem ser observados hoje, nas casas de planta rectangular ou poligonal, que estão em menos quantidade mas que, não obstante, existem. A cobertura do casario passou a recorrer à telha, ao invés da palha de centeio. Os pavimentos das ruas e dos pátios começaram a ser lajeados. Os romanos trouxeram também novas formas de trabalho, como a produção de azeite e de vinho, a salga, a moagem, a olaria. Da mesma forma, parece ter nascido, com a interferência latina, uma certa hierarquização do povoado, com casas de materiais mais ricos do que outras.

Árvore no limite do núcleo urbano

A limitada flora na Cividade de Terroso

Depois veio a normalização. As tribos que antes se opuseram ao poder vindo da península itálica foram-se diluindo no espírito da Pax Romana. Assim funcionou na Ibéria como em toda a Europa ocidental incluída no império. Progressivamente, e em especial a partir do final do século I d.C. e no início do século II d.C., a população da Cividade de Terroso foi descendo a encosta. Os conflitos tribais pré-romanos tinham chegado ao fim. A guerra contra Roma também. Mais valia aproveitar-se o contexto para se explorar a imensa várzea e o mar infinito.

Novas terras nasceram. Uma delas, a sul do Cabo de Santo André, de nome Euracini, ficou mais tarde conhecida pelos seus bravos homens da faina – talvez gente descendente de fenícios, dizem uns; talvez de vikings, dizem outros; mas com grande probabilidade com uma ligação profunda ao velho povo castrejo que há dois mil anos habitou o Monte de Terroso e a vizinha Serra de Rates. Eram os primeiros anos da terra que agora se conhece por Póvoa de Varzim.

Rua do eixo este-oeste na Cividade de Terroso

A rua que une o lado nascente ao poente

Ao longe, o Monte de São Félix

Ao fundo, entre folhas de eucalipto, o Monte de São Félix

A dupla muralha interna da Cividade de Terroso

A muralha interior, de muro duplo

Estátua de homenagem ao pescador e porto da Póvoa de Varzim

Póvoa de Varzim

Um curto roteiro histórico com o melhor da Póvoa de Varzim. Surpreendentes destinos, saborosos repastos, sossegadas dormidas.

Promoções para dormidas na Póvoa de Varzim

Mapa

Coordenadas de GPS: lat=41.41234 ; lon=-8.72308

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