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Em Quadrazais, aldeia próxima do Sabugal, existe um linguajar raiano que é apenas do conhecimento daqueles que, quando as fronteiras eram mesmo fronteiras, e o contrabando uma necessidade de subsistência, tiveram de encontrar formas para comunicar sem que outros os entendessem – deram-lhe o nome de Quadrazenho ou Contrabandês, e nunca passou da sua forma oral para a escrita.

Língua de trabalho

Não é caso único em Portugal. Já falámos aqui, em forma de entrevista, do dialecto Piação do Ninhou, existente em Minde e Mira de Aire, em que a criação de uma gíria tinha também o objectivo de encriptar mensagens para ouvidos menos desejados. Nesse caso, a razão era o comércio têxtil. Aqui a razão é outra, mas com um intuito claramente comercial: fazer dinheiro com o contrabando quando o controlo de fronteiras era feito ao milímetro.

O Quadrazenho, enquanto modo de comunicação, nasceu desse contexto, das burocracias aduaneiras entre nós e o país vizinho, numa altura em que ir de Elvas a Badajoz dava dores de cabeça, só de pensar. Ora, alguns visionários contrabandistas achavam que essa linha que não se vê, a que separa Estados, só atrapalhava. E vai daí entraram num negócio, à época, ilegal. Ironia do destino, o que eles faziam antes, de forma ilícita, é hoje tido como prática comum, fomentada pelas mais altas autoridades europeias.

Mas voltando às décadas do não se pode. Por esses anos, os habitantes de Quadrazais dedicados ao contrabando inventaram termos só por eles compreendidos, não passando de palavras sem sentido para os fiscais que vigiavam a raia. Os guardas, de resto, tinham um nome apelativo: fachos, ou facheira se quisessem falar do conjunto deles. Um apontamento curioso e revelador de uma certa acutilância política das gentes de Quadrazais.

Misturavam o francês de alguns emigrantes, o espanhol da vizinhança raiana, e um português meio deformado, em forma de calão local. E os manegos (manego é Quadrazenho para rapaz) falavam esta mescla entre eles, com a certeza de que ninguém os descodificaria. Assim se foi construindo um tecido lexical que só começou a desfiar na década de 60, quando a emigração se tornou mais apetecível e o contrabando do café entrou em declínio.

Hoje, os mais antigos, em jeito de farra, ainda o falam. Pelo menos quando querem que apenas alguns os entendam.

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