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O ovo é quase sempre a matéria-prima óbvia da doçaria portuguesa, ainda mais a de origem conventual. Os Ovos Moles de Aveiro serão, porventura, o paradigma dos doces conventuais, entretanto massificados por uma produção já industrializada.

Começou como muitos doces – um aproveitamento da parte dos ovos que não servia para nada. Mais tarde, essas sobras resultaram naquele que é, provavelmente, o mais famoso doce do país.

Origem dos Ovos Moles de Aveiro

É a primeira coisa que nos lembramos quando falamos de Aveiro, a par da Ria e dos Moliceiros que, antes, por lá nadavam. E a razão por ser tão imediata a lembrança é, em grande parte, a sua antiguidade.

Desde o início do século XVI que as freiras do Convento de Jesus de Aveiro (hoje convertido em museu), fizeram experimentações com o açúcar doado pela Casa Real, originário da Madeira. Primeiramente, era usado como curativo para os doentes que lá entravam. Mas quando os ovos e galinhas de uma aristocrata, Dona Brites, começaram a ser fornecimento habitual do convento, o açúcar ganhou uma outra finalidade.

As claras dos ovos tinham vários usos, o mais conhecido deles era a sua utilização como forma de engomar os vestidos das freiras. Mas as gemas, que como é óbvio, também fazem parte do pacote, não serviam para nada. Além do mais, as gemas tinham um prazo de validade curtíssimo, depois de aberta a casca e retirada a clara. E aí entrou a doçaria, quando, depois de diversos testes, se confirmou que juntando açúcar às gemas elas duravam mais tempo do que o normal.

Não sabemos exactamente quando apareceram os primeiros Ovos Moles, mas, dado o contexto, podemos afirmar com alguma dose de segurança que o embrião deles apareceu aqui. No fundo, com uma receita com base em água, ovos e açúcar que se foi actualizando, juntando-se posteriormente a capa actual, feita de uma finíssima massa de farinha – a mesma usada nas hóstias ou como cápsula comestível de alguns medicamentos. Hoje há quem coloque os ovos em pequenas barricas de madeira, devidamente ilustradas com imagens alusivas à cidade de Aveiro (ver imagem em baixo).

No final, o resultado foi o que conhecemos: divulgou-se tanto, que, com o fim dos conventos, acabou por deixar de ser estritamente produto de mãos devotas. Conta-se que foi mesmo a empregada da última freira que por lá viveu que, sabendo do segredo, o levou consigo para a rua. E assim se celebrizaram os Ovos Moles, por muitos considerados a base de inspiração de muitos outros que surgiram depois.

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Barricas de Ovos Moles com imagens alusivas à cidade de Aveiro

Pequenas barricas de madeira com imagens alusivas a Aveiro guardam o mais famoso doce de ovos do país: os Ovos Moles

Receita dos Ovos Moles

O mais difícil, quando pensamos fazer Ovos Moles, é garantir que o creme amarelado, isto é, os ovos, tenham a consistência certa. Sabendo essa parte, o resto é muito fácil.

É tão simples que os ingredientes não passam de um par deles: açúcar e gemas de ovo. Primeiro, colocam-se 500 gramas de açúcar ao lume, juntamente com 3 decilitros de água – deixamos ferver até ficar em ponto de cabelo. Assim que estiver pronto, retira-se do lume e deixa-se arrefecer.

Enquanto arrefece, preparamos os ovos (30, para este caso): separamos a gema da clara, porque só vamos usar a primeira. Colocamo-las num recipiente, mas sem as bater – fazemos apenas um pequeno corte em cada uma para as deixar sangrar. Juntamos depois as gemas ao caldo de açúcar e metemos tudo ao lume, novamente, deixando cozer até ganhar consistência. Mais uma vez, é importante que não haja meximento do caldo – com uma colher de pau, devemos apenas andar com ela de um lado para o outro, evitando até fazer-se círculos com ela.

Por fim, colocamos este recheio dentro de formas de hóstia, habitualmente com imagens de motivos marinhos, como conchas, búzios ou peixes.

Uma nota final para quem quiser fazer uma versão mais barata: muitos, inclusivamente produtores reputados, enchem o creme com arroz cozido moído ou farinha de arroz, evitando gastos maiores em ovos.

Lenda dos Ovos Moles

Voltando aos conventos, particularmente ao Convento de Jesus falado acima, conta-se que os primeiros Ovos Moles apareceram por acaso. É uma origem lendária, e ainda assim possível de acontecer.

Diz-se que uma freira, ao cometer o pecado da gula, foi castigada pela sua superior. Aparentemente, a freira era de gancho, porque nem o castigo a demoveu e começou ela mesma a fazer um doce com os ovos e o açúcar que se produzia no convento. Tantas vezes o fez que algum dia teria de ter problemas com isso e enfrentar a situação de ser reincidente no pecado mortal.

Um dia, ouvindo passos e percebendo que seria apanhada em flagrante, decidiu esconder o preparado no meio da farinha usada para as hóstias. No dia seguinte, as freiras, quando olharam para a massa das hóstias, viram-nas recheadas de um doce tão bom que facilmente o adjectivaram de divinal, uma bênção enviada lá de cima.

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