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Não será surpresa para ninguém quando dizemos que o Lince Ibérico está em perigo de extinção. Ainda assim, a coisa melhorou significativamente nos últimos anos, com reintroduções que apanham o Baixo Alentejo e o Algarve. E notícias recentes vêm em tom mais optimista. Uma boa altura para se falar dele sem a corda na garganta.

Um felino que esteve à beira do abismo foi recentemente ressuscitado. O caso ainda é preocupante mas as boas notícias vão aparecendo, de ano para ano. Nos arredores de Mértola, o Lince-Ibérico já voltou à natureza.

O felino selvagem da Península Hispânica

Sendo honesto, nunca tive o prazer de ver um Lince Ibérico no ambiente que lhe é confortável: nos matas, normalmente secas, do interior. Resta-me só falar de acordo com quem já o viu nesses termos, prazer raro de se ter, e célere demais, conta-se, pois passa tão rápido que um piscar de olhos é suficiente para lhe perdermos o rasto.

Sempre que me meti em terrenos que moram junto à fronteira, sobretudo sobranceiros ao Tejo ou ao Guadiana, ou mesmo quando andei pela Serra de Monchique, tive uma vã esperança de ter uma destas flechas felinas a passarem-me à frente. Nunca tal aconteceu, o que me obriga a esta posição inevitavelmente humilde de ter de falar do Lince Ibérico do lado de fora. E falar dele como pessoa de fora é um pouco como olhar para um quadro e relatar o que lá está: trata-se de um animal com uma beleza africana estonteante, digno de um postal de safari subsaariano. Que ele more, actualmente, na metade de baixo da península hispânica, falando de grosso modo, é um privilégio. Privilégio nosso, não deles, entenda-se.

Formalmente, dizemos que é um animal esbelto e elegante, como qualquer felídeo, doméstico ou selvagem. Cauda curta, membros musculados carregados de destreza, olhos de gato com manha. Podemos fazer notar as suas orelhas cujas pontas são adornadas por espigos de pelo que apontam ao céu, como antenas. Por estranha simetria, nas laterais abaixo do rosto, caem bigodes em direcção ao chão. A cor da pelugem confunde-se com a flora quente e rasteira e gramínea das planícies do sul – um cinzento amarelado ou um amarelo acinzentado que lhe dá o roupão certo para caçar camuflado.

E a caça, já que falamos dela, faz-se de coelhos, mais que tudo. Aí, em pose de ataque, serve-se da visão – os tais olhos de lince que os humanos popularizaram em expressão mundial. Avista a presa, mesmo que pequena, a dezenas de metros. E, em vez de correr, caminha até à refeição vagarosamente, passo a passo, até estar a um pulo de a segurar com as patas. Esta preferência pelo coelho-bravo, que é um quase monopólio na dieta do Lince Ibérico, tornou-o refém da sua existência. Essa é uma das razões para a sua eminente extinção: a queda de coelhos-bravos, por doença ou pela caça, deixou os linces sem alimento. Outra que não é de somenos é a sua fraca diversidade genética, dificultando a sua adaptação às transições das paisagens rurais.

 
A mãe e as crias

O felino em maior perigo de extinção tem morada em dois países: Portugal e Espanha

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O lince ibérico e a probabilidade de extinção

Há quem diga que o pior já lá vai. Até há pouquíssimos anos, o Lince Ibérico esteve a uma unha de desaparecer da fauna do presente. No século XX, passou de residir em praticamente todo o território português a ser uma raridade em pequenos focos nacionais, como a Serra de Monchique, a Serra de Espinhaço de Cão, os montes que seguem para Espanha vindos da Serra da Estrela, e o Parque do Tejo Internacional. No início do novo milénio, a população de Linces-Ibéricos tinha sumido de Portugal, e indo ao total da península, o número não chegava à centena de exemplares, todos concentrados na Serra Morena e na Serra Doñana, em Espanha.

E foi por esta altura que as primeiras medidas dignas de nome entraram em vigor. Em Portugal, foi sobretudo na segunda década do novo milénio que os resultados começaram a chegar. Primeiro, através do controlo feito pelo Centro Nacional de Reprodução do Lince Ibérico (CNRPLI), em Silves, os exemplares não param de aumentar. Depois, em cativeiro, após serem soltos em herdades próximas do Guadiana guarnecidas de coelhos-bravos, apareceram boas notícias nos anos de 2015 e 2016: ninhadas de duas a quatro crias.

A meio de 2016, o número de exemplares a viver cá fora era de vinte e dois Linces-Ibéricos. Um valor pequeno, mas ainda assim com tendência crescente, sobretudo tendo em conta as futuras reintroduções vindas do CNRPLI. Se juntarmos Espanha, os números chegam para lá dos quatrocentos – nada mau para quem estava reduzido a dois dígitos há vintes anos. No entanto, o estado da espécie em Portugal ainda é de “Criticamente em Perigo” (em Espanha, subiu-se um patamar, estando agora “Em Perigo”).

Vamos esperar que as boas novas continuem a inundar jornais, e que o fornecimento que Silves tem prestado a este icónico elemento da fauna selvagem portuguesa se mantenha bem sucedido.

 

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