Igreja do Salvador de Aveleda

by | 10 Dez, 2024 | Douro Litoral, Lugares, Monumentos, Províncias, Religiosos

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Ainda vivido como principal espaço sagrado da freguesia, a Igreja do Salvador de Aveleda tem no exterior e no interior dois mundos e duas épocas. Fica em Lousada e faz parte da Rota do Românico.

O românico que não morre

No lugar deste templo, que na prática continua a ser a igreja paroquial de Aveleda, deve ter havido antiga construção igualmente religiosa (e sepulcral), talvez do tempo moçárabe ou mesmo visigótico ou suevo, a julgar pela pedra ornamentada e aproveitada para montar a escada do presbitério. Estamos, portanto, a falar de um período incerto e pouco rigoroso, algures entre o século V e VIII. É de justiça que se dê o contraditório a esta hipótese, citando Luís Sousa, que neste relatório respeitante a trabalhos arqueológicos efectuados na igreja defendeu que a origem da dita pedra se situa na transição do século XIII para o século XIV: “a técnica e os motivos gravados não se afastam da composição escultórica patente no portal principal da Igreja do Salvador de Aveleda”.

Seja como for, tenha ou não havido um espaço litúrgico moçárabe ou visigótico, uma coisa se sabe: conforme sugere a referência à ecclesia de Auelaneda, um novo alçado foi construído, por volta do século XII, ou seja, na alvorada de Portugal, sendo esse de feição românica, como era moda à época, e tinha já como orago São Salvador.

Por fim, uma outra solução, sobreposta à anterior, foi promovida pelo final do século XIII ou início do século XIV. Empregou alguns dos elementos antigos mais elementares, como é o caso da nave e, especialmente, da fachada. É esse empreendimento, somado às devidas actualizações ulteriores, que agora vemos.

E é nesta última reconstrução ainda ocorrida na Idade Média que há mais a dizer. À altura em que a nova Igreja do Salvador de Aveleda foi levantada já o gótico se havia instalado na Europa – e o mesmo se aplicava, salvaguardando as habituais demoras, a Portugal (o Mosteiro de Alcobaça abriu estaleiro na segunda metade do século XII, por exemplo). No entanto, a predilecção que as comunidades rurais tinham pelo estilo românico, aquele que acompanhou a fundação nacional e ajudou a fixar povoações nos vales férteis do Norte, é inegável. Manifestou-se em alguns dos monumentos medievais da bacia do rio Sousa, um dos quais este.

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Daí que exista quem utilize a expressão tardo-românico ou românico de resistência, sendo esta última designação até mais sagaz do que a primeira, pois dá ênfase à ideia de luta contra a emergência de um novo cânone – emergência que, na realidade, estava a acontecer. Porém, a resistência do românico não foi impermeável às novas influências vindas da Europa Central, e a pegada gótica também pode ser reconhecida em alguns detalhes se houver atenção: nota-se que no pórtico, em vez de um arco de volta perfeita, se vê, outrossim, um arco quebrado.

Mas do lado exterior, se descontarmos os enxertos modernos, como a sacristia adossada à ala norte, ou a torre anexada à fachada, não há como não relacionar o templo com alguns outros exemplares integrados no imaginário do Norte bucólico e românico: nas paredes, densas e largas, de quem sabe que se aguenta à maioria dos testes que o tempo lhe reserva; na estreiteza dos vãos, mais próximos de seteiras do que de janelas, que parca iluminação dão ao interior; nas colunas do pórtico e em específico dos seus capitéis, ornamentados com pinhas, perfeitamente enquadrado nas decorações vegetalistas que caracterizam o Vale do Sousa.

Todavia, todo este panorama que encontramos cá fora e que nos remete para a arquitectura rural duriense ou minhota dos séculos XI, XII, XIII e início de XIV desvanece assim que entramos. Lá dentro, a atenção prende-se a outras modernices.

Os ricos e a riqueza da Igreja do Salvador de Aveleda

Quem quer que tenha financiado o tecto da nave e da capela-mor, bem como do arco que as separa, tinha rendimento e conhecimento suficientes para contratar um bom mestre. Márcia Santos Barros fala da Princesa e Duquesa de Bragança como possível patrocinadora, indicando o “facto desta Igreja de Aveleda ter integrado o Padroado Real”. Soares de Moura menciona a Casa de Santo Ovídeo como impulsionadora do restauro, o que, se tivermos em conta que a Casa de Santo Ovídeo era parte do padroado, e o padroado se encontrava protegido pelo mecenato régio, vai dar ao mesmo: dinheiro da Casa Real.

No fundo, e para descomplicar, não há como fugir a alguém muito influente e muito abastado como propulsor das pinturas interiores da igreja de Aveleda, pois dificilmente se vê tanto talento num templo que se diria de dimensionamento modesto.

Não se trata apenas do contraste. É certo que a elegância e a suavidade das pinturas, devedoras a um rocócó muito em voga no século XVIII, batalham contra o traço espartano do românico, e que o contraste por si só as faz sobressair. Mas mesmo individualizando a obra pintada, o que aqui temos é trabalho de excelência, em particular o trompe l’oeil que enquadra a Santíssima Trindade e os vinte e oito caixotões decorativos da capela-mor que entoam a Ladainha Lauretana. Sobre estes últimos, e para quem, católico ou não, conhece a oração dedicada a Nossa Senhora, lanço o desafio: sussurrem para vocês próprios a litania e façam corresponder os painéis a cada um dos versos – não é fácil, mas com ajuda das representações (e das mensagens em si inscritas, em latim) é possível lá chegar.

O tecto da nave, embora, falando por mim, menos impactante, é de impressionante tamanho e detalhe técnico, e combina uma representação da Ascenção de Cristo, junto à entrada, com uma Alegoria à Eucaristia, junto à cabeceira.

Junte-se a tudo isto o privilégio de estarmos a olhar para pinturas originais, tal e qual como foram desenhadas nos idos setecentistas. As requalificações feitas no final do século XX e no início do século XXI foram maioritariamente de limpeza, dado os painéis se encontrarem bem conservados. Só vantagens.

Pórtico e óculo da Igreja do Salvador de Aveleda
O arco ligeiramente quebrado do pórtico
Tecto, arco, e capela-mor
A excelência das pinturas no interior
A sacristia vista do lado de fora
Novos enxertos – sacristia em primeiro plano com a torre sineira ao fundo
Aspecto exterior da casa do pároco
Casa do pároco, defronta da Igreja do Salvador de Aveleda
Motivos vegetalistas típicos do Vale do Sousa
Um dos muitos portões de acesso às Honras feudais

Lousada

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Coordenadas de GPS: lat=41.27949 ; lon=-8.25272

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