Amêijoas à Bulhão Pato
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Bulhão Pato foi um poeta. Gostava da boa vida – caçava muito, bebia bem, comia melhor. Tanto lhe agradava o prazer da gastronomia portuguesa que acabou por ficar mais conhecido pelos pratos que ajudou a inventar do que pelos versos com que se aplicava a escrever. No entanto, as Amêijoas à Bulhão Pato não foram uma criação sua.
Origem das Amêijoas à Bulhão Pato
O livro “Dicionário Prático da Cozinha Portuguesa” refere que a origem do prato é lisboeta, mais concretamente do antigo Restaurante Estrela de Ouro, situado na Graça. Um outro, mais antigo, de nome “A Cultura Gastronómica em Portugal” remete o nascimento de tal prato para o mesmo sítio.
Sabemos que Bulhão Pato foi responsável pela confecção de alguns activos da gastronomia lusitana ainda hoje cozinhados, como é o caso da Lebre à Bulhão Pato. E sabemos também que Bulhão Pato gostava de dedicar a sua prosa (e por vezes a poesia) aos pequenos prazeres da vida, e que não se rogava a bem dizer de alguma coisa que lhe tinha confortado o estômago. É possível, portanto, que o cozinheiro do Restaurante Estrela de Ouro quisesse recompensar certas boas palavras proferidas por Bulhão Pato ao seu trabalho.
Certo é que as amêijoas apanhadas no Tejo, por aquela altura (isto é, no século XIX), eram já coisa apetecida, e a inovação aqui veio apenas da mudança de fórmula no seu acabamento.
Mais de cem anos depois, esta simples confecção das amêijoas estremenhas foi candidata a ser uma das 7 Maravilhas da Gastronomia Portuguesa.
O hábito de comermos amêijoas tem centenas e centenas de anos. No entanto, foi no século XIX que as aprendemos a cozinhar com um molho alimonado e coentros – à Bulhão Pato, como ainda hoje dizemos.
Prato de Inverno ou de Verão?
Não será preciso dizer, mas as Amêijoas à Bulhão Pato, como de resto qualquer outro cozinhado que envolva mar ou rio, aparece ao desejo durante os meses de Verão, com vinho branco ou cerveja gelada a acompanhar.
No entanto, e tendo em conta uma máxima que não é só um cliché, é sempre preferível comer marisco nos meses que têm a letra erre consigo. Ou seja, de Setembro a Abril, quando as águas estão mais frias e o bafo quente do ar não arrisca estragá-lo.
Honestamente, dando opinião pessoal, é precisamente no Inverno que melhor sabem, abrasadas no lume do molho Bulhão Pato.
Receita para as Amêijoas à Bulhão Pato
Miguel Esteves Cardoso, homem reconhecido nacionalmente como um bom garfo, afirma que não há ninguém que prepare as amêijoas tão bem quanto Portugal, mas que, por outro lado, raramente nos damos ao trabalho de as fazer tão bem quanto sabemos.
Tendo a concordar. Dificilmente gosto de um prato tanto quanto gosto de umas excelentes Amêijoas à Bulhão Pato. Mas também dificilmente consigo comer umas Amêijoas à Bulhão Pato às quais aplique o adjectivo excelente. Isto porque há duas formas de as estragar. Ou pelo molho, que até é bem básico, mesmo para um principiante. Ou pela amêijoa.
Posto isto, aqui segue uma sequência de actos que aprimoram o resultado final.
O primeiro passo é limpar a areia dos bivalves. Processo fácil mas longo: terão de se colocar em água temperada com sal durante um bom par de horas, ou até mais se houver tempo disponível para isso, e lavá-las de seguida.
Depois, tudo fica simples: coloca-se alho cortado ou esmagado juntamente com azeite num tacho, a seguir juntam-se coentros picados, um pouco de vinho branco, e quando o ferro ferver, colocam-se as amêijoas. Mexemos com uma colher de pau e tapamos o tacho, deixando as amêijoas a ganhar condimento em lume médio ou alto. É aqui que elas vão perder o pudor e começar a abrir.
Por fim, a etapa final. Colocam-se as amêijoas numa travessa – apenas as amêijoas – e o molho ficará a apurar por mais um ou dois minutos. Servirá esse para regar os bivalves que retirámos há pouco, dando-lhe o gosto do Bulhão Pato. Corta-se o sabor com um pouco de sumo de limão.
Nunca, jamais, esquecer o pão, que vai varrendo o prato até nada sobrar que não conchas.