Melro
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Sabemos que o título do texto está incompleto, e que quando falamos de um Melro falta, no mínimo, dizer se ele é preto ou azul – isto esquecendo, para já, outras sub espécies.
Lá chegaremos às diferenças que existem entre ambos e que vão bem além da cor. O que mais queremos destacar é a presença persistente deste pássaro em território português, do campo à cidade, do Minho ao Algarve.
São como aqueles irmãos que contam com o mesmo apelido mas que não podiam ter personalidades mais distintas: o Melro Preto dá-se às cidades e não tem medo das pessoas, o Melro Azul é um eremita que raramente sai das escarpas onde faz ninho.
O cantar do Melro
Sempre que se fala de tal ave, é nas melodias que pensamos.
Todos os anos, lá para o mês de Fevereiro ou Março, ou seja, quando o clima começa a secar, os Melros machos abrem a garganta do alto de uma qualquer plataforma e soltam melodias de corte às fêmeas. Pode ser facilmente identificado – tem um assobio com uma espécie de aliteração do érre, agudo e pronunciado.
No campo, onde sempre se escuta a voz dos animais, vê-se o timing do cantar do Melro como um sinal: quando cantarola mais tarde, no início da Primavera, as colheitas vão ser boas; quando a cantoria vem cedo demais, como por exemplo em Janeiro, as colheitas vão ser más (admite-se, neste caso, que o Melro está a antecipar o término da época das chuvas, penalizando os frutos da terra). Já diz o ditado, Quando o Melro canta em Janeiro, é tempo de sequeiro o ano inteiro.
Por outro lado, nos jardins citadinos, o canto assobiado do Melro tem outra conotação, aqui mais positiva: a chegada do bom tempo. Assim se vê como até num cantar inofensivo de um pássaro, a cidade e o campo conseguem ter perspectivas bem diferentes.
Melro Preto
Com a óbvia excepção do pombo, o mais comum dos pássaros portugueses é bem capaz de ser o Melro Preto, visto das zonas mais rurais às mais urbanas.
No campo, vagueia por espaços amplos – planícies ou colinas, em searas e em leiras e em eiras. Por lá é vítima de alguma má fama, nem sempre justificada. Uma outra expressão comum dita pelos semeadores é Melro de bico amarelo come a semente e o farelo. Ora, um Melro Preto de bico amarelo não é um Melro mas sim um Estorninho – que de resto tem um revestimento mais lustroso, como se pusesse brilhantina no pelo todas as manhãs. Ainda assim, parece que a confusão entre um e outro existe, o que faz com que o Melro leve por tabela pelos prejuízos causados por terceiros.
Já na cidade, para onde se tem exilado, fugindo aos ódios campestres, anda pelos espaços verdes mais vastos à procura de minhocas e insectos – alimento fácil em alamedas e jardins -, e surpreendentemente indiferentes ao passar das pessoas. Essa é uma das suas maiores características que o faz sobressair de outros exemplos da avifauna portuguesa. O Melro Preto, sobretudo nas urbes, não tem qualquer medo da presença humana. Por vezes conseguimos aproximar-nos até estarmos a um metro deles.
De resto, entre o macho e a fêmea há diferenças que baste. Aliás, quando falamos do Melro Preto, normalmente imaginamos o macho: pelugem negra na quase totalidade do corpo, à excepção do bico (alaranjado) e de um anel (também alaranjado) que envolve cada um dos olhos. Mas há a fêmea, que por vezes sobrevoa à nossa frente e nós assumimos ser outra espécie – é mais clara, meio cinzenta, e o bico não tem a coloração tão vibrante quanto a do Melro rapaz.
Melro Preto: um residente português, de norte a sul, no Verão e no Inverno
Melro Preto, a discreta fêmea
Melro Azul
E por oposição à amiudada presença do Melro Preto em tudo o que é pedaço de relva ou de mato neste país, o Melro Azul só nos aparece à vista com esforço e alguma sorte. Com esforço porque requer passagem por regiões de rochas serranas fracturadas, ou por ribeiras rasgadas por fragas, ou por pedras talhadas de castelos abandonados. O Melro Azul é pássaro de pedra bruta, sem polimento, e não gosta do betão das cidades. Com sorte porque mesmo que estejamos em terra afeita aos seus voos, não é fácil descortiná-lo, não só por ter a cor do céu, como por ser bem mais desconfiado da proximidade do homem e, como tal, nidificar em locais inóspitos de quase impossível acesso.
Ainda assim, mesmo que bem escondido, é igualmente considerado espécie residente em Portugal.
Além do canto mais estridente, a marca de diferença entre este e o Preto é, como será fácil de supor, a cor. Pondo de lado a conversa de que a beleza é sempre subjectiva, o Azul, quando comparado ao seu primo mais escuro, acaba por ser mais bonito. Sobretudo pela singularidade da cor azul que apresenta a partir do segundo ano de vida – isto falando, mais uma vez, do macho, dado a fêmea ter coloração menos efusiva, em tons de castanho acinzentado.
Melro Azul, o parente raro dos Melros de Portugal