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Há uma árvore que vemos frequentemente junto a qualquer centímetro quadrado de terra que esteja ameaçado por água doce – o amieiro, inconfundível elemento ribeirinho que pode ser observado um pouco por todo o país, embora mais em certos feudos do que noutros.

Guardião de rios

Se virmos uma árvore de médio porte próxima de uma ribeira, de uma lagoa, de um pântano, o mais provável é que estejamos na presença de um amieiro, de um choupo, ou de um salgueiro, mas, mesmo assim, mais hipóteses há de ser o primeiro do que qualquer um dos outros.

O amieiro, nesse aspecto, não esconde aquilo que o faz feliz: água e mais água, sempre doce, e preferencialmente a passar-lhe por cima ou ao largo da raiz. Não que a terra menos húmida o mate, mas certamente diminui-lhe a esperança média de vida.

É por isso que quanto mais perto das ribas está, melhor se desenvolve, muitas vezes crescendo em par, em margens opostas, estendendo os ramos entre si, formando túneis de galhos que ensombram e embelezam os leitos. E é por isso, de igual forma, que a sua distribuição em Portugal privilegia a zona Centro e a zona Norte, onde as chuvas são mais frequentes e os rios e ribeiras conseguem fugir aos meses de secura.

As margens fluviais são, com efeito, muitas vezes confundidas com os próprios amieiros. São eles que limitam os rios ao bloquear as águas, impedindo-as de galgar os sulcos. Estabelecem, assim, a fronteira entre a terra arável e a terra submersa, o mundo dos homens do mundo das náiades. Se o nome guarda-rios não estivesse já tomado por uma ave, teria aqui boa aposta – seria até um guardião-de-rios, dado o seu tamanho, que facilmente chega aos vinte metros de altura, e que até pode ir aos trinta em casos raros.

Na toponímia nacional, percebemos que as povoações que recebem o nome Amieiro ou Amieira estão quase sempre localizadas perto de rios ou ribeiras de pouca profundidade, o habitat por excelência da espécie. Tal acontece, por exemplo, com a aldeia da Amieira, junto ao Alqueva, e com a aldeia do Amieiro, próxima do rio Tua.

Distinguir um amieiro

Quando olhamos para um amieiro velho – e neste caso velho será com mais de cinquenta anos, já que a sua longevidade é curta, poucas vezes superando a centena de anos – notamos a sua frondosidade. No entanto, o amieiro começa por ser uma árvore cónica. É depois da juventude que decide crescer de forma mais desorganizada, tanto para cima como para os lados, retorcendo os seus ramos à medida que se vai prolongando.

Já o tronco, por outro lado, tem um só sentido – para cima, hirto, como um poste eléctrico. Atinge, em alguns pontos da Europa, mais de trinta e cinco metros. Por cá, dificilmente chega tão alto. Em média, na realidade, deverá contar com cerca de dez a quinze metros de altura.

No entanto, mais do que pela casca (que começa por ser cinzenta e vai enegrecendo com o tempo), e mais do que pela dimensão ou altitude do tronco, o amieiro distingue-se pelo recheio. Pelas folhas, quando existem, ou seja, na Primavera e no Verão. E pelas flores, quer masculinas, quer femininas.

Começando pela folhagem. Não só a forma da folha de amieiro é singular – meio ovular, com nervuras, e recortada nas pontas -, como também se diferencia pelo toque, deixando os dedos que a palpam pegajosos. Mesmo a sua dupla cor, de um verde escuro e luminoso de um lado, para um verde claro e baço do outro, serve como elemento diferenciador.

Já na floração, temos dois meios de distinção – um através da flor masculina (uma espécie de berloque que cai dos galhos), outro através da flor feminina (arredondada e, depois de fecundada, semelhante a uma pequena pinha). Curioso que, olhando para ambos os géneros, a flor masculina lembre o órgão sexual masculino e a flor feminina lembre, grosso modo, um óvulo. Mas mais interessante é a altura em que a flor resolve aparecer, pelo final do Outono, quando as folhas desaparecem. Fica assim o amieiro nu, apenas com a floração à vista – tal como acontece, por exemplo, com a amendoeira -, o que o torna perfeitamente reconhecível durante o Inverno.

Um sinal característico - a flor do Amieiro

A folha e a flor

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Usos e costumes

Vem de longe, o hábito de pegar nas várias partes do amieiro para resolver problemas quotidianos.

A casca é usada para tinturaria na industria têxtil e na chapelaria, sobretudo para cores laranjas, acastanhadas e negras, mas também como extracto farmacêutico para cura de febres. Adoptada a chá, a casca, segundo o saber popular, servia também como terapia para patologias digestivas (úlceras, diarreia, inflamações intestinais). Utiliza-se igualmente na curtição de couros.

As folhas que, como já se disse, são extremamente viscosas, eram antes usadas como analgésico para dores articulares ou musculares, sobretudo nas extremidades, isto é, nos pés e nas mãos. Da mesma forma, a folhagem, quando pisada ou esmagada, servia para estancar sangramentos e hemorragias. Além disso, era comum aquecerem-se folhas de amieiro e juntá-las ao banho doméstico para curar doenças reumatológicas.

Quanto ao tronco, fornece a madeira adaptada para diversos usos. A madeira de amieiro caracteriza-se por ser de bom recorte, embora não muito maciça, portanto moldável e relativamente leve. Além disso, tem uma cor característica, férrea quando exposta ao ar livre, colocando-a como uma substituta mais barata do mogno. Boa para trabalhos de carpintaria, é ela que vemos nas belas máscaras do Carnaval de Lazarim. E não só. Mobília, instrumentos musicais como flautas ou violas (há braguesas parcialmente feitas de madeira de amieiro), utensílios de cozinha, tamancos, sebes, artigos náuticos. Os usos são múltiplos, tendo apenas como limite a sua dimensão – não sendo o tronco de grande envergadura, objectos colossais não podem ser reproduzidos a partir dele.

Árvore multifacetada, o amieiro, conclui-se, é de extrema importância na economia e no ecossistema nacional. Os rios e ribeiras de Portugal não se esquecem disso. Cabe aos portugueses também não se esquecerem.

Tronco e folhagem do Amieiro

Casca, copa, e a folha de dois distintos verdes

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