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O Carvalho é uma das árvores autóctones mais icónicas de Portugal, assim como de outras nações espalhadas pelo mundo fora, visto existirem mais de seiscentas espécies destas árvores do género Quercus, sendo por muitos considerada a “rainha” das árvores. Em tempos os carvalhais terão sido a composição dominante das florestas ocidentais europeias, incluindo Portugal, o que explica o porquê de haver um número extenso de localidades com nomes como Carvalho, Carvalha, Carvalhal, Carvalhais, Carvalhosa, Carvalhedo, Carvalheiro, Carvalhinho ou Carvalhido um pouco por todo o país. Em algumas zonas onde ainda se pode observar como seria a floresta autóctone é notável a predominância de carvalhos, como é o caso da Mata da Albergaria (Serra do Gerês), da Mata da Margaraça (Serra do Açor) ou da Mata do Solitário (Serra da Arrábida), entre outras. Talvez devido a ter dominado em tempos a floresta europeia, o carvalho tem também uma simbologia mítica e uma presença incontornável na cultura ocidental visto marcar presença nos antigos mitos e cultos dos povos Indo-Europeus nossos antepassados, como é o caso dos povos celtas, gregos e germânicos. Ainda hoje, o carvalho é uma árvore especialmente venerada e homenageada, estando a representação das suas folhas presente inclusive em bandeiras nacionais ou em emblemas de várias organizações e sendo considerada a árvore nacional em diversos países.

O Carvalho é uma das árvores mais icónicas do mundo, e em tempos foi a grande rainha da floresta portuguesa, podendo-se ainda hoje em dia encontrar frequentemente carvalhais com exemplares majestosos destas árvores, que têm ainda um forte poder evocativo e simbólico.

Em Portugal é ainda a árvore de eleição para celebrações com raízes ancestrais como é o caso da Festa da Cabra e do Canhoto, onde a madeira de velhos carvalhos é a privilegiada para fazer a enorme fogueira que marca esta celebração, entre outros apontamentos na etnografia portuguesa. Efectivamente, a madeira de carvalho contribui para a simbologia associada a esta árvore, pois é uma madeira altamente resistente e forte, o que concede ao carvalho uma associação à força e à perseverança. As reconhecidas propriedades da madeira do carvalho levam ainda a que tenha sido e ainda seja utilizada nos mais variados usos, tendo sido utilizada no passado para a construção de barcos incluindo os célebres drakkar vikings, os tradicionais currach irlandeses e os navios utilizados nos nossos Descobrimentos, e sendo hoje em dia utilizada como madeira de alta qualidade para mobília e para a construção de barris utilizados para armazenar e ajudar ao envelhecimento de diversas bebidas alcoólicas, proporcionando-lhes maior qualidade.

Adicionalmente, o carvalho é a árvore que ocupa o lugar na nossa imaginação da árvore eleita para a típica imagem de um bosque frondoso, talvez devido às belas formas que os seus grossos ramos serpenteantes geram e às suas icónicas folhas. Esta ramificação tortuosa é visível principalmente nos carvalhos mais ancestrais, sendo que os carvalhos podem viver centenas de anos, como é o caso do monumental Carvalho de Calvos em Póvoa de Lanhoso que tem mais de 500 anos, havendo até quem afirme que já atingiu o milénio de idade. Para além disso, os carvalhos são especialmente propícios à coexistência com outras espécies vegetais e proporcionam também abrigo a muitas espécies animais. Muitas espécies de carvalho actuam como protectores do solo e reguladores dos ciclos hidrológicos, e como tal um bosque de carvalhos é um habitat óptimo para as mais diversas plantas, ajudando assim a gerar belas matas e proporcionando um rico eco-sistema. E apesar dos carvalhos em si serem altamente resistentes ao ataque de fungos por a sua madeira ter um valor elevado de taninos, o eco-sistema proporcionado por bosques de carvalhos é também favorável ao aparecimento de muitas espécies de cogumelos.

O fruto emblemático do carvalho, a bolota, por sua vez, serve de alimento para um sem-número de espécies animais como é o caso de esquilos e javalis, os quais ajudam inclusivamente à propagação dos carvalhos, visto que o esquilo esconde muitas vezes as bolotas no solo para a posterioridade, e por vezes estas germinam em jovens carvalhos, e o javali ajuda também a espalhar as bolotas pelos solos. Para além do papel que a bolota desempenha na Natureza, esta é também muito útil ao ser humano, sendo utilizada na pecuária para alimentar porcos. Apesar de ser raro hoje em dia, a bolota também contém um valor alimentício para o homem, e antigamente costumava ser usada para fazer pão, licores e outros alimentos, sendo hoje em dia ainda possível encontrar receitas de bolotas em alguns locais. Convém advertir para não confundir a bolota, que é efectivamente o fruto do carvalho, com os chamados bugalhos, umas bolas com aspecto espicaçado que estão penduradas nos ramos, as quais resultam de uma reacção de defesa da árvore contra insectos que tentem depositar ovos nos ramos, criando assim o bugalho, uma espécie de excrescência onde o insecto se desenvolve sem estar na madeira do ramo propriamente dito.

Embora a monocultura de espécies não-autóctones como o eucalipto esteja a ameaçar seriamente o carvalho, felizmente este ainda é visível por todo o território nacional, com umas espécies mais dominantes numas áreas do que outras. Entre as espécies mais comuns em Portugal destacam-se o carvalho-cerquinho, carvalho-alvarinho, carvalho-negral, carvalho-americano e o carvalho-das-canárias, não esquecendo a carvalhiça, que embora se trate de um arbusto, partilha com os seus irmãos de grande porte o género Quercus. Algumas destas espécies podem-se cruzar gerando assim híbridos, mas um exemplar genuíno de cada uma delas tem uma forma específica o suficiente para conseguir ser identificada, principalmente a partir das folhas. Um factor adicional de diferenciação é a caducidade da folha, que varia entre as espécies, havendo carvalhos de folha caduca (o que significa que perdem as suas folhas em estações mais frias como o Outono e o Inverno, voltando estas a crescerem na Primavera), carvalhos de folha marcescente (cujas folhas secam e mudam de cor no Outono e Inverno mas não caiem, mantendo-se na árvore até nascerem novas folhas verdes na Primavera) e carvalhos de folha perene (o que significa que mantém a folha verde todo o ano, como é o caso do sobreiro e da azinheira). De facto, para quem não sabe, árvores como o carrasco, a azinheira e os icónicos sobreiros dos montados alentejanos também são espécies de carvalho, pertencendo também ao género Quercus, no entanto, devido a serem árvores icónicas no panorama português pela sua especificidade, merecem secções dedicadas às mesmas, sendo que aqui nos focaremos nas árvores que são propriamente chamadas de carvalhos.

Carvalho-Cerquinho (Quercus faginea)

O carvalho-cerquinho é também chamado de Carvalho Português, e é de facto nativo da zona mediterrânea ocidental da Península Ibérica, sendo portanto encontrado facilmente em Portugal, justificando o seu nome. É uma árvore que pode chegar aos 20 metros de altura e cuja longevidade pode alcançar os 600 anos. Tem uma folha verde escura, que no outono e inverno se torna acastanhada, e a sua bolota é uma das bolotas preferenciais para a alimentação do porco-preto. Em tempos terá sido a árvore dominante na zona Centro-Litoral de Portugal, mas infelizmente devido à acção humana os seus números reduziram drasticamente. De facto, foi de carvalhos-cerquinho que se obteve a madeira para as naus, caravelas e navios que participaram nos Descobrimentos portugueses, assim como a madeira para outros veículos como os carros de bois, e hoje em dia ainda é muito usada para vigas de construção, assim como para pipas e barris, sem esquecer que também é muito usada para lenha de alta qualidade. No entanto, ainda é uma árvore muito comum em serras como a Serra de Montejunto, Serra de Sintra, Serra de Aire e Candeeiros, Serra de São Luis, Serra do Cercal (que lhe conferiu o nome de carvalho-cerquinho) e com grande predominância na Serra da Arrábida. Adicionalmente, encontram-se carvalhos-cerquinho nas regiões de Sicó e Concelho de Alvaiázere, e por vezes em zonas ribeirinhas como é o caso da lagoa de albufeira, Ribeira de Coina e Ribeira de Avis. O carvalho-cerquinho é de folha marcescente, o que se enquadra perfeitamente na sua natureza como um carvalho que parece estar entre os carvalhos mais característicos do sul como o sobreiro e a azinheira e os carvalhos mais característicos do norte do país, como o carvalho-alvarinho e o carvalho-negral. A sua mata preferencial é inclusive a mata mediterrânea com alguma influência atlântica, onde o carvalho-cerquinho convive com medronheiros, zambujeiros, aroeiras, loureiros, sorveiras e os seus primos sobreiros e carvalhiças. O carvalho português teve uma grande importância na nossa história pelo fornecimento da sua madeira para a construção naval, sendo merecedor sem dúvida do seu nome, e permanece como um belo exemplar de carvalho, que é nativo do nosso país, merecendo algum cuidado para poder voltar a ter maior presença nas nossas matas da zona oeste.

Floresta de Carvalho Cerquinho

Carvalho Português

Carvalho-Alvarinho (Quercus robur)

O carvalho-alvarinho, também chamado de Carvalho Roble ou Carvalho Inglês, é a espécie-tipo do género Quercus, o que significa em efeitos práticos que é o carvalho por definição, e a sua folha, uma folha verde-escura (tornando-se acastanhada no Outono antes de cair) com vários lóbulos de forma arredondada, é a mais icónica e reconhecida de todos os carvalhos, sendo a folha que é usada em geral como símbolo de carvalho nas mais diversas representações, inclusive no símbolo da Associação Nacional de Conservação da Natureza, de seu nome também Quercus. É provavelmente o carvalho mais comum em quase todo o continente europeu, sendo nativo do mesmo, e no nosso país encontra-se em grande quantidade no Minho, no Douro Litoral e em Trás-Os-Montes, encontrando-se também frequentemente nas Beiras. No passado foi efectivamente a árvore dominante nestas regiões, que teriam sido preenchidas por extensos carvalhais. Nas áreas florestais do Minho, assim como em certas zonas de Trás-Os-Montes, como no Parque Natural de Montesinho, é ainda uma árvore muito predominante, com a qual nos deparamos constantemente e que caracteriza a paisagem. Tal como alguns dos outros carvalhos, a sua madeira é de alta qualidade e usada para vários fins, os quais já foram referidos anteriormente, sendo que a madeira do carvalho-alvarinho é especialmente resistente à humidade, uma consequência porventura desta espécie estar altamente adaptada a climas temperados húmidos e ter grande resistência ao frio. É uma árvore de folha caduca, mas quando a sua copa está densamente preenchida de folhas na Primavera e no Verão, um carvalho-alvarinho é uma visão impressionante e majestosa, principalmente quando já tem alguma longevidade, o que se traduz também em troncos e ramos extremamente grossos e imponentes e uma altura que pode chegar aos 40 metros. Um carvalho-alvarinho pode alcançar uma longevidade dos 500 aos 1000 anos, sendo que há inclusive alguns exemplares na Europa que se pensa terem chegado aos 1200 e aos 1500 anos. Um dos carvalhos mais antigos de Portugal, o já mencionado Carvalho de Calvos, é um carvalho-alvarinho. Se há um carvalho que encarna na perfeição a figura majestosa e imponente associada ao carvalho e o seu simbolismo ancestral de força e resistência, é o carvalho-alvarinho, o “rei” dos carvalhos.

Carvalho Alvarinho impõe-se numa clareira

Carvalho Roble

Carvalho-Americano (Quercus rubra e Quercus coccinea)

O carvalho americano, tal como o seu nome o diz, é de facto nativo da América do Norte, tendo sido introduzido em território nacional a dada altura, ao contrário do carvalho inglês, que apesar do nome não é de todo exclusivo de Inglaterra, mas sim nativo de quase toda a Europa, inclusive Portugal, como já referimos. Assim sendo, e ao contrário das outras espécies de carvalho que aqui referimos, o carvalho americano não é uma espécie autóctone em Portugal mas sim uma espécie exótica, e pode ser potencialmente invasora, visto ter uma elevada capacidade de germinação da sua bolota, embora não se apresente como uma ameaça tão nefasta como a praga de eucaliptos no nosso país, nem de perto. Para além disso, a sua madeira, embora de boa qualidade, é mais fraca do que a madeira de carvalhos nativos como o carvalho-cerquinho ou alvarinho, e ao contrário destes, que têm uma boa capacidade de resistência aos fogos, o carvalho americano arde mais facilmente, juntando-se ao rol de árvores como o eucalipto e o pinheiro que facilmente levam à propagação de incêndios florestais. Apesar destes problemas, e embora se encontre com frequência pelo país fora, muitas vezes num contexto ornamental, não é de todo tão comum como outros carvalhos que são de facto nativos como o carvalho-alvarinho, e esperemos que assim se mantenha. É fácil diferenciar o carvalho-americano pois a sua folha apresenta uma forma recortada, ao contrário das folhas de carvalho-alvarinho, que têm lóbulos arredondados. No Outono é ainda mais fácil de identificar, pois apesar de ser de folha caduca, enquanto as folhas ainda se mantiverem na árvore estas ganham uma cor fortemente avermelhada, levando esta característica a que também se dê a este carvalho o nome de carvalho-vermelho-americano. Não obstante os senãos que este carvalho apresenta, é efectivamente um carvalho, e como tal também apresenta a imponência majestosa e beleza característica dos carvalhos, podendo chegar aos 28 metros de altura e atingir uma longevidade de cerca de 500 anos. A sua copa de folhas avermelhadas durante o Outono, em conjunção com outras árvores, ajuda a criar o espectáculo de cores que caracteriza esta estação. Convém ainda esclarecer que embora em geral o nome de carvalho-americano se refira à sub-espécie Quercus rubra, também se aplica à sub-espécie Quercus coccinea, a qual apresenta características semelhantes, incluindo uma folha também de forma recortada e avermelhada no Outono.

 

Carvalho Americano avermelhado pelo Outono

Quercus Coccinea

Carvalho-Negral (Quercus pyrenaica)

À primeira vista, o carvalho-negral pode parecer semelhante ao carvalho-alvarinho devido a ter também os icónicos lóbulos arredondados, no entanto, com maior atenção, verifica-se que é uma folha diferente, com um eixo central relativamente mais estreito do que a grande folha do alvarinho, e é por vezes aveludada na página inferior. Para além da forma, a folha do carvalho-negral é marcescente, e não caduca como a do carvalho-alvarinho. Durante o Outono a sua cor também varia, tornando-se parda, o que lhe confere também o nome de carvalho-pardo ou carvalho-pardo-das-beiras. Apesar da sua designação científica de Quercus pyrenaica, é uma árvore rara nos Pirenéus, mas é nativa nas regiões circundantes, como é o caso do sudoeste francês, Espanha, Portugal e Norte de África, estando presente no nosso país sobretudo no Centro e no Norte, mas também no Sul, em volta de regiões como a de Castelo de Vide, no Alto Alentejo. Em tempos, existiram extensos carvalhais de carvalho-negral nas margens do rio Côa, e hoje em dia Portugal ainda é, inclusivamente, o país com a maior área existente de carvalhos-negral. É chamado de carvalho-negral pois o seu tronco e ramos costumam ter uma cor acinzentada escura, e adicionalmente, um bosque de carvalhos-negral, graças a estes formarem copas muito densas, é um local bastante escurecido e protegido do sol, sendo óptimo para parques de campismo onde a protecção do sol é essencial no verão. A sua madeira é de boa qualidade como é comum aos carvalhos, e é muito utilizada em carpintaria e para fazer pavimentos, assim como para lenha. É um dos carvalhos com maior facilidade em gerar híbridos, especialmente com o carvalho-alvarinho e mesmo com o carvalho-cerquinho, e é também um dos mais eficazes reguladores dos ciclos hidrológicos dos solos. Talvez devido à sua boa capacidade como protector dos solos, encontra-se frequentemente acompanhado de plantas que são favorecidas pelo eco-sistema que os carvalhos-pardos proporcionam, como é o caso de Selo-de-Salomão, Rosa-Albardeira ou da Arenária. Tal como outros carvalhos é uma bela e majestosa árvore, podendo atingir os 25 metros de altura e uma longevidade de cerca de 300 anos.

Floresta de Carvalho Negral

Carvalho Pardo

Carvalho-das-Canárias (Quercus canariensis)

O nome do carvalho-das-canárias é enganador, tanto na sua designação comum como no nome científico, pois este não é espontâneo das Ilhas-Canárias, e tem este nome devido a um erro de etiquetagem quando um botânico primeiramente o identificou no séc. XVIII. Na realidade o carvalho-das-canárias é nativo na Algéria, em Marrocos, na Tunísia, em Espanha, e em Portugal. No nosso país a situação do carvalho-das-canárias é um pouco insólita, pois encontra-se sobretudo na Serra de Monchique, embora possa encontrar-se pontualmente noutras zonas do Algarve, mas é raríssimo em qualquer outra região do território nacional. Efectivamente, devido a isso mesmo, o carvalho-das-canárias é também chamado de carvalho-de-monchique, um nome que é inteiramente justificado pela sua quase-exclusividade nesta região. É uma árvore de grande porte como os outros carvalhos, podendo atingir os 30 metros de altura e uma longevidade até 250 anos, mas não suporta bem o frio, ao contrário de carvalhos como o alvarinho e o negral, motivo pelo qual, porventura, a sua propagação se tenha restringindo à Serra de Monchique. É frequente encontrá-la no meio de sobreirais, dando-se bem com os seus primos, e confirmando a sua natureza como uma árvore mais característica do sul. A sua folha é especialmente elegante e bonita, oscilando entre caduca e marcescente, consoante o ano. A sua raridade torna-a um dos motivos para os apaixonados da natureza e da botânica visitarem a Serra de Monchique, e um motivo de orgulho para os habitantes da mesma.

Folhas e bolotas do Carvalho das Canárias

Carvalho das Canárias

Carvalhiça (Quercus lusitanica)

A carvalhiça, também chamada de carvalho-anão, apesar de pertencer ao género Quercus, não é uma árvore, mas sim um arbusto, o qual não ultrapassa os 50 cm, mas que tem muitas das outras características associadas ao carvalho, produzindo igualmente bolotas e tendo folhas que se assemelham às de outros carvalhos, especialmente às do carvalho-cerquinho. Até mesmo o seu tamanho diminuto não a impede de fornecer boa madeira, sendo que a madeira da carvalhiça também é utilizada para barris. Devido às características reminiscentes do carvalho-cerquinho, pode até suceder confundir uma carvalhiça com um carvalho-cerquinho a crescer, mas são efectivamente sub-espécies diferentes. As carvalhiças são muito curiosas pelo seu tamanho diminuto, e podem gerar autênticos “tapetes” pois podem ter uma grande densidade de folhagem, e ecoam alguma da beleza dos seus irmãos de grande porte, sendo especialmente belo encontrar um carvalho rodeado de carvalhiças. A sua designação científica é de facto derivada do nome da antiga Lusitânia, e é realmente uma espécie autóctone da nossa flora, mas não é exclusiva de Portugal, existindo também em Espanha e Marrocos. No entanto é muito comum no nosso território, especialmente nas zonas mais a oeste do sul até ao centro, e convive muito bem com o carvalho-cerquinho e com o sobreiro, assim como com outras árvores como pinheiros.

Folha da Carvalhiça

Carvalho Anão

Simbologia e Mitologia

Como foi referido anteriormente, o carvalho está associado a um forte simbolismo e significância mitológica, em geral interligado com a noção de força e resistência, assim como com fenómenos como o trovão e o relâmpago, e no passado, era uma das árvores sagradas de muitas das religiões pagãs dos povos europeus previamente à chegada do cristianismo. Para os povos celtas, que atribuíam às árvores uma grande sacralidade, o carvalho era talvez a árvore sagrada por excelência, e um sinónimo de força assim como de sabedoria, estando o nome proto-celta para carvalho possivelmente na origem etimológica do nome dos sacerdotes celtas, pois “druida” significaria “sabedoria/conhecimento do carvalho”. Este aspecto dos druidas é reforçado pela célebre descrição de Plínio de um ritual sagrado dos druidas, no qual estes cortavam o visco dos carvalhos utilizando uma foice de ouro em determinadas fases da lua e finalizavam o ritual com a evocação aos deuses por via de um banquete e o sacrifício de dois bois brancos. Nesta descrição, tanto o visco como o carvalho são descritos como sagrados para os druidas e o visco retirado de um carvalho é descrito como utilizado para criar poções, as quais curam a infertilidade de qualquer animal e funcionam como antídoto contra venenos.

De facto, os famosos bosques sagrados dos povos celtas, designados de nemeton, são frequentemente descritos nas fontes clássicas como sendo bosques de carvalhos, e um nemeton específico da antiga Galácia (na actual Anatólia), chamado de drunemeton, indica pela sua etimologia que se tratava de um espaço sagrado de carvalhos. É possível que esta noção também se estendesse aos povos pré-romanos que habitaram o território que hoje em dia é Portugal, como é o caso dos galaicos e dos lusitanos, os quais seriam possivelmente povos de matriz cultural celta no caso dos primeiros ou com alguma influência celta no caso dos segundos. Um factor que nos pode levar a considerar a presença desta sacralidade do carvalho nos nossos antepassados é a presença de carvalhos centenários em volta de locais de culto religioso onde existem ermidas, capelas ou mosteiros, visto que uma das estratégias do cristianismo para assimilar os povos pagãos era a sincronização de algumas características dos cultos pré-cristãos com o novo paradigma religioso, incluindo a assimilação de antigos locais de culto pagão através do erigir de monumentos religiosos de índole cristã nesses mesmos locais. Esta associação do carvalho a locais religiosos pode ser verificada em exemplos como o mosteiro abandonado de Pitões das Júnias no Gerês, que tem como guardião um alto e frondoso carvalho ou a capela de São Lourenço na Serra da Estrela (de notar que São Lourenço era frequentemente utilizado para “substituir” divindades pagãs), rodeada de imponentes carvalhos centenários.

Ainda dentro do contexto céltico, o carvalho era ainda associado ao deus Taranis, o deus celta do trovão. Esta associação do carvalho ao trovão era uma característica não apenas dos povos celtas, mas também de outros ramos dos povos Indo-Europeus. Para os povos nórdicos/germânicos o carvalho também era uma árvore sagrada, mais especificamente a árvore sagrada de Donar/Thor, o deus do trovão, e há registos de que em tempos existiu na Alemanha um carvalho sagrado dos germânicos pagãos dedicado a Thor, que terá sido cortado no séc. VIII. Uma associação semelhante encontra-se também na mitologia grega, na qual o carvalho era igualmente a árvore sagrada de Zeus (novamente, um deus do trovão), assim como no paganismo eslavo, no qual, novamente, o carvalho é associado ao deus do trovão Perun. É possível que esta associação do carvalho ao trovão pelos povos Indo-Europeus tenha perdurado através do folclore popular, no qual é comum a crença de que a madeira de um carvalho atingido por um relâmpago tem propriedades mágicas.

Tais significâncias míticas adequam-se perfeitamente à imponência e beleza dos grandes carvalhos, porventura as árvores mais emblemáticas da Europa. No nosso país marcam uma forte presença, sendo motivo de grande rejúbilo e bem-estar passear em bosques onde estes estão presentes. É imperativo reforçar a ideia de que estes verdadeiros reis do bosque, título mais do que adequado aos carvalhos, merecem a mesma reverência, respeito e adoração que os nossos antepassados lhes dedicaram, e ao visitar carvalhais é fácil perceber porquê. Esperemos que mantenham a sua forte presença, e que esta seja inclusive incentivada e aumentada através de iniciativas para plantar mais carvalhos, ao invés da propagação de eucaliptos que ameaça gravemente a nossa floresta autóctone, criando áreas florestais estéreis, secas e sem alma, ao contrário dos vibrantes e frondosos bosques de carvalho. Para quem puder e encontrar o tempo e a vontade, plantar carvalhos recomenda-se e ajuda o nosso belo património natural a voltar a reflorescer como merece, a partir de um dos seus mais valorosos elementos: o carvalho.